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Manoel Galdino

PEC da corrupção

Reduzir os controles de fiscalização é retrocesso

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Jair Bolsonaro e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre, em abertura da Marcha dos Prefeitos - Pedro Ladeira - 09.abr.2019/Folhapress

O Senado aprovou no último dia 9 a PEC 61/2015, que permitirá que emendas individuais ao Orçamento federal sejam repassadas diretamente para estados e municípios. Não haverá a necessidade de convênios e prestação de contas a órgãos como a Caixa Econômica Federal, que hoje controla a maioria das parcerias entre União, estados e municípios.

A consequência óbvia dessa medida é que o controle sobre os recursos, que já não era perfeito, será muito reduzido. Não haverá controle interno dos órgãos federais sobre convênios, pois estes não existirão. 
Organizações como a Transparência Brasil, que conseguem monitorar esses recursos porque há prestação de contas unificadas em nível federal, terão imensa dificuldade de fiscalizá-los. Será necessário solicitar as informações a cada município ou estado.
 
Similarmente, o controle do TCU (Tribunal de Contas da União) também será mais difícil. Em suas auditorias, o órgão não poderá utilizar os sistemas de informação unificados do governo federal. Com menos controle interno (federal), externo e social, o resultado será mais ineficiência e corrupção —razão pela qual, para nós, essa é, na verdade, uma PEC da corrupção.

A Transparência Brasil tem monitorado a construção de creches e escolas por todo o país com recursos federais, parte dos quais vêm justamente de emendas de congressistas. Hoje, esses recursos são controlados pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), e municípios e estados que recebem recursos precisam prestar contas. Caso haja irregularidades, são bloqueados. Nós já detectamos indícios de fraudes em muitas licitações —algumas comunicadas ao TCU para que tomasse providências, evitando preventivamente erros na execução da obra.

Uma das principais questões para atrasos nas obras é a incapacidade do próprio fiscal. Muitas vezes trata-se de um secretário municipal, pois é o único engenheiro na prefeitura que pode assinar como responsável. Em outras situações há muitas obras para poucos fiscais, que não conseguem cumprir a função adequadamente.
 
Como costuma acontecer no Estado brasileiro, fiscaliza-se mal a entrega e a execução de contratos. Problema que o controle social, como o nosso e de outras organizações, tem tentado atacar.
Em vez de enfrentar as falhas que paralisam obras e provocam atraso nos repasses, os senadores preferiram o caminho fácil de extinguir controles existentes e permitir a gastança desenfreada.

Emendas individuais ao Orçamento foram fontes de dois grandes escândalos de corrupção desde a redemocratização (“anões do Orçamento”, nos anos 1990, e “sanguessugas”, nos anos 2000). Ao reduzir controles, a medida é um retrocesso na luta pela integridade e efetividade de políticas públicas no país. É, no fundo, uma PEC da corrupção.

Manoel Galdino

Doutor em ciência política pela USP, é diretor executivo da Transparência Brasil

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