Uma boa notícia: em 10 de maio, 187 países signatários da Convenção da Basileia adotaram um acordo histórico que mira a poluição plástica nos oceanos. Com isso, nenhuma sucata plástica poderá mais ser exportada sem consentimento prévio do país recebedor.
Agora uma notícia surpreendente: o Brasil não aderiu à decisão. Além dele, dentre os signatários da convenção, apenas a Argentina. É incoerente: o combate ao lixo no mar foi adotado como prioridade —ao menos no discurso— do atual governo. Tem sido a única agenda positiva do Ministério do Meio Ambiente.
A pasta ambiental classificou essa agenda como uma “inovação” e a “resposta coordenada e integrada à poluição do ambiente marinho” como mote. Até o presidente Jair Bolsonaro (PSL) tuitou sobre o assunto.
A incoerente relutância nos colocará no radar dos exportadores de lixo. As economias ricas reciclam plásticos de alta qualidade domesticamente e mandam os de baixo valor para países pobres. Em tese, esses últimos se beneficiam do plástico com menor custo, e os ricos podem poupar investimentos em infraestrutura de reciclagem. Na prática, os exportadores “lavam as mãos” assim que o material ultrapassa suas fronteiras: contabilizam-no como reciclado nas metas domésticas, mas desconhecem o seu verdadeiro destino.
Até 2016, metade de todos os plásticos destinados à reciclagem foi exportado por 123 países, com a China tomando a dianteira da importação (51%). Em 2017, uma normativa chinesa proibiu a importação de 24 tipos de resíduos. O impacto dessa medida foi desviar resíduos para outros países, muitos com menos estrutura, aumentando a poluição marinha. Uma vez no mar, o lixo não respeita fronteiras. Um exemplo é que o lugar mais densamente poluído por plásticos é a desabitada ilha Henderson, no Oceano Pacífico.
Limpar os mares é questão urgente. Deixar de sujar, também. Por isso, dificultar o trânsito internacional de lixo sujo é um primeiro gol a favor em um jogo de um longo campeonato. “Em campo”, temos de um lado aqueles que querem resolver a crise de lixo no mar através da redução em larga escala do plástico consumido. De outro, alguns jogadores ávidos por inundar a economia —e, por conseguinte, os mares— com materiais descartáveis com curto tempo de vida. De que lado está o Brasil?
Vale lembrar que, em 2009, o Ibama interceptou uma carga de lixo sujo enviada sem autorização da Inglaterra para o Brasil. Valendo-se da Convenção da Basileia, o Brasil devolveu 89 contêineres cheios de seringas, preservativos, fraldas sujas e outros. “O Brasil não é a lixeira do mundo”, disse à época o então presidente do Ibama, Messias de Franco. E não somos mesmo.
As autoridades brasileiras de 2019 precisam destrocar os sinais que têm dado a nós. Precisamos dar circularidade à economia, redesenhando a cadeia de valor do nobre plástico.
O Ibama, por virtude histórica, não é descartável nessa equação, mas tem sido tratado como tal. A nova regulação internacional também não —mas o Brasil fez feio. Todos são peças de uma nova economia do plástico, que aposto que vai ganhar esse campeonato. O Brasil precisa jogar do lado certo.
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