O tema sobre o elevado spread praticado pelo sistema bancário brasileiro tem sido recorrente desde o Plano Real. Impacientemente, ele retorna com mais impacto nos momentos em que, depois de reduzida a taxa Selic, observa-se que a margem de intermediação financeira líquida dos bancos foi pouco afetada.
Nesse ambiente, surgem, pelo menos, duas perguntas. A tão propalada “concentração bancária” não seria a causa dos elevados spreads? Por que o Banco Central (BC), o nosso xerife do mercado financeiro, não atua para aumentar a concorrência, beneficiando o consumidor?
Começa a operar aqui o que Roberto Campos disse certa vez: “Sempre que há muita indignação nas consequências, normalmente as causas estão mal dimensionadas”. O incêndio da emoção consome a razão.
É importante lembrar que, já na sua agenda BC+ (hoje, BC#), o Banco Central enfrenta problemas estruturais na busca de aperfeiçoamento do sistema financeiro. Nela está em estudo a aceleração da tendência mundial para a “consolidação bancária”; ou seja, a redução do número de bancos tradicionais e suas eventuais causas, como: as inovações financeiras de mercado, os impactos da tecnologia da informação na oferta de crédito, as moedas e bancos digitais e, obviamente, os impactos da consolidação na determinação dos spreads bancários.
Nessa perspectiva, ao final de maio, o BC divulgou um pequeno estudo-resumo intitulado “Concorrência, Concentração e Custo do Crédito”, que deve servir de subsídio para a elaboração do Relatório de Economia Bancária. No estudo-resumo, o BC reconhece que “a relação entre concorrência, concentração e spread bancário é controversa (...) e que a correlação entre essas variáveis não implica, necessariamente, relação de causalidade”.
Os estudos econométricos foram feitos usando dados de três modalidades de crédito: capital de giro, desconto de recebíveis e financiamento, que estão entre as principais modalidades do crédito livre para empresas. Os principais resultados foram: 1 - a concorrência —e não a concentração— é a variável relevante a ser analisada no que se refere aos spreads de empréstimos a empresas no Brasil; 2 - esses estudos não permitem a interpretação de causalidade estrita, mas apontam uma certa robustez estatística e econômica que justificam o foco na concorrência —e não na concentração— para a explicação dos spreads.
Ora, partindo de seus próprios estudos, o BC não deve “interferir” para reverter a tendência à concentração que hoje se verifica, pois não obteria a redução dos spreads. Enfrentar a concentração para outros fins, talvez. Ademais, é grande a literatura internacional que reforça o estudo do BC e confirma a consolidação bancária como uma tendência mundial irreversível. A concentração bancária, mediante o aumento de economias de escala e de escopo, é a principal fonte das inovações tecnológicas e financeiras que têm chegado ao consumidor no mundo.
No Brasil de hoje, é muito provável que as expectativas adversas geradas por quem resiste às reformas econômicas, em especial, ao ajuste fiscal, sejam precificadas elevando a margem de intermediação financeira. Há quase seis anos com déficits primários recorrentes, e uma relação dívida pública-PIB em rota explosiva, o Brasil vive os seus dias de cão.
Estamos agora em um ponto de inflexão. Nesses momentos emotivos, a prudência passa a ser a melhor arte que todo Banco Central precisa dispor. E bem!
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