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Números do desespero

Autoridades devem voltar suas atenções os casos de desesperança na meia idade

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Alissa Harrington visita o túmulo do seu irmão, o fuzileiro naval Justin Miller, que se matou em 2018
Alissa Harrington visita o túmulo do seu irmão, o fuzileiro naval Justin Miller, que se matou em 2018 - Jenn Ackerman - 13.dez.18/The Washington Post

Os Estados Unidos registraram a maior taxa de suicídios desde a Segunda Guerra Mundial. De acordo com dados recém-divulgados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças, o índice de 2017 foi de 14 pessoas por 100 mil habitantes, o maior já aferido desde 1942, quando o país estava envolvido no maior conflito armado da história.

A taxa representa um aumento de 33% ante a de 1999, e a escalada afeta praticamente todos os grupos populacionais. Mas o suicídio não é o único gesto extremo a aparecer nas estatísticas de óbitos.

Trabalhando com os dados dos EUA, o casal de economistas de Princeton Anne Case e Angus Deaton (Nobel de 2015) propôs o conceito de “mortes por desespero”, que inclui também os casos de overdose e doença hepática relacionada ao álcool. Estes, afinal, podem ser consideradas meios indiretos de dar cabo da própria vida.

Ainda que sujeita a alguma controvérsia, a definição proporcionou revelações interessantes.

O grupo mais afetado, descobriu-se, era o dos brancos não hispânicos de meia idade. O trio de causas de morte nessa coorte teve um impacto tão devastador que já deixa uma cicatriz demográfica.

Enquanto a esperança de sobrevida de negros e hispânicos de meia idade (45 a 54 anos) continuou a crescer como ocorre pelo menos desde o pós-guerra, a desses brancos apresentou uma reversão.

Mesmo nesse grupo existem diferenças. Enquanto a sobrevida daqueles com alto grau de instrução seguiu aumentando, a daqueles com ensino médio ou menos experimentou a maior retração. Encontraram-se também correlações geográficas, sanitárias e políticas.

Áreas que passaram por forte degradação econômica apresentam maiores taxas de morte por desespero. Piores indicadores de saúde, em especial com a presença de doenças crônicas, também prognosticam maiores índices. E onde há mais óbitos por desespero foi maior a votação em Donald Trump.

A tese de Case e Deaton é que o acúmulo de desvantagens —na educação, no emprego, na vida pessoal, na saúde— leva a uma desesperança que culmina na meia idade e tem graves implicações sociais e políticas. É um fenômeno para o qual autoridades devem voltar suas atenções, não só nos EUA.

Economistas analisaram a mortalidade do Reino Unido, por exemplo, e concluíram que movimentos similares, embora em escala muito inferior, podem estar em curso.

A considerar tal raciocínio, resultados eleitorais em países diversos sugerem que a escalada do desespero pode ser mais generalizada.

editoriais@grupofolha.com.brr

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