Passei pela biblioteca da Universidade Federal de Ouro Preto e vi cartazes em defesa da nossa educação, pedra angular para o desenvolvimento de qualquer país. Como as primeiras páginas de "No Caminho de Swann", obra de Proust que abre a série "Em Busca do Tempo Perdido", descrevem um narrador invadido por uma enxurrada de memórias ao comer uma madeleine com chá, ao olhar para esse templo de livros estáticos e estudantes ávidos por conhecimento, minhas ideias entraram em ebulição.
Tivemos um ensino superior tardio, dado ao fato de Portugal restringir o acesso ao ensino universitário, diferentemente, por exemplo, da Espanha, que implantou universidades em suas colônias, com o intuito de produzir um contingente para suprir a demanda de cargos burocráticos (não à toa a primeira universidade das Américas foi fundada em 1538, em São Domingos). Por isso, no Brasil, no início do século 19, tínhamos apenas escolas de carreira (ginecologia, anatomia e formação de dentistas), instituídas por Marquês de Pombal, e, somente a partir de 1827, é que surgiram as faculdades de direito em São Paulo e Olinda.
Mas será que essa gestação tardia poderia ser a causa do nosso atraso? Mesmo sabendo que diversos países aperfeiçoaram suas matrizes educacionais e adquiriram know-how em 100 anos? Talvez o que Roberto Campos utilizava para mostrar que nossa pobreza “não pode ser vista como uma imposição da fatalidade”, e sim como resultado de um “mau gerenciamento e negligência na formação de capital humano”, justifique tais indagações.
Aliás, o ensino superior é apenas a ponta final de um longo processo educacional e reflete bem as falhas ocorridas nas outras fases de formação, especialmente a educação básica. Em Sobral, no Ceará, a educação ia de mal a pior até que um gestor público decidiu mudar a situação e elevou o município a destaque nacional. A política implementada fortaleceu a gestão escolar —a partir da seleção de diretores por méritos, em detrimento das indicações; a criação de uma escola de formação de professores; e a atribuição de incentivos salariais para eles a partir do desempenho dos alunos.
Outra parte da solução está na forma de financiamento, que atualmente é predominantemente público, enquanto universidades pelo mundo diversificam as formas de captação de recursos e estimulam a participação de capital privado, caso da união da British Petroleum e a Universidade de Berkeley para criar o Energy Biosciences Institute.
Avançando nessa seara, proponho um teste: entre na sala do curso de medicina de qualquer universidade federal do Brasil e verás que a grande maioria que ali se faz presente tem condições de pagar pela educação recebida. Por isso, com exceção daqueles de baixa renda e incapazes de financiar seus estudos, o Estado deveria cobrar matrículas e mensalidades — uma contrapartida pela boa formação ofertada, afinal na iniciativa privada eles não teriam um custo mensal de R$ 5.000? Esses recursos poderiam ser investidos na educação básica e até superior, modelo difundido em vários países.
Outro aspecto candente é a relação com o setor privado para desenvolvimento de tecnologias e pesquisas e financiamento de projetos. O Brasil, quando ousou aproximar empresas e universidades, obteve êxito: a sinergia entre Centro de Tecnologia da Aeronáutica e ITA, fulcrais para a gênese da Embraer; as parcerias entre Embrapa e universidades no agronegócio; as tecnologias criadas por UFRJ e Petrobras, em conjunto, para extração de petróleo em águas profundas; e o Impa, um expoente em ciências exatas que recebeu recursos do CNPq, BNDES e Finpe ao longo dos anos, além de ofertar cursos não gratuitos, e alçou Artur Avila à medalha Fields.
A soma dos fatores supracitados gera educação de qualidade. Talvez o maior problema do ensino superior não esteja exatamente nele, mas simplesmente na educação de base e seu efeito cascata. Um gigante com pés de barro, assim caminha a universidade no Brasil.
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