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James Ackel

Jair vai seguir o caminho de Jânio?

Presidentes guardam semelhanças em trajetórias

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O jornalista James Ackel - Bruno Poletti - 16.set.14/Folhapress

Jânio Quadros foi um político de meteórico sucesso até atingir a Presidência da República. E foi eleito com a bandeira da moralidade pública. A sua música de campanha dizia: "varre, varre, vassourinha / varre, varre a bandalheira".

Jair Bolsonaro (PSL) foi um fenômeno eleitoral baseado num desgaste dos políticos tradicionais e no desejo do povo em ter um comandante diferente da política tradicional do país, eleito na mesma matriz de campanha de Jânio Quadros, qual seja varrer a bandalheira do mensalão, petrolão "et caterva".

Jânio tomou posse nos anos 1960 com o povo acreditando em suas promessas. Jair tomou posse em 2019 com o povo acreditando em suas promessas.

Jânio apelou ao sensacionalismo político —ou marketing, como preferem alguns, que dizem que Jânio não precisava de marqueteiro porque ele era o seu próprio marqueteiro. Jair apela para um sensacionalismo político com declarações que poderiam ser chamadas de programas de fofoca na TV.

Com poucos meses de governo, Jânio acreditou que venceria a máquina do Congresso Nacional. Em um país onde existem mais de dois partidos, o governo tem que negociar para manter maioria. E a negociação pode ser limpa ou suja, ao prazer do comandante. 

Jânio sucumbiu ao Congresso quando políticos ameaçaram de processo a primeira-dama, Eloá Quadros. Ele desejava pôr o Congresso na parede, tendo ao seu lado, ostensivamente, o apoio do Exército. Mas, depois que Jânio condecorou Che Guevara, este apoio do Exército, em plena Guerra Fria, era impossível, o que fez Jânio compreender estar sozinho.

Uma derrota depois da outra causou clima de depressão no gabinete janista. Muitos comentam que, nas madrugadas de Brasília, ele procurava compensação na bebida. E, numa dessas suas crises, teria rabiscado em um papel o texto da renúncia —mas logo a seguir jogado no lixo, sem rasgar. O simples papel amassado teria sido capturado por alguém no cesto de lixo e, de imediato, levado ao Congresso sem que Jânio tivesse tempo de contestar.

Jair está colecionando derrotas no Congresso. Cada dia pela manhã, em conversas com jornalistas, mostra-se irritado, falando bobagens. Na campanha, quando bradava seus desejos por novas leis e a intenção de acabar com antigas, dizia coisas como se o Congresso fosse um mero homologador, como se o Parlamento fosse ter medo dele por achar que ele, Jair, tinha ao seu lado as Forças Armadas para o que desse e viesse.

Na primeira oportunidade em que o Congresso peitou Jair, viu-se que o jogo de Jair era um blefe por não ter reis nas cartas —no caso, não ter os generais de tropas ao seu lado para o que desse e viesse. A maior humilhação foi ver o seu porta-voz, general Otávio do Rêgo Barros, preterido numa promoção do Alto-Comando do Exército. Ali, naquele momento, Jair teve um choque de cultura militar.

Ao entender que as Forças Armadas não estavam ao seu lado na coação ao Congresso, começou a mudar seus termos e a desdizer suas promessas de campanha de extremo conservadorismo. Até dizer, nestes dias, que ele não pode tudo o que quer.

Aliados de extrema-direita nas redes sociais passaram a desacreditar no poder do eleito. Uma das piores declarações de Jair foi afirmar que ele mandava na Polícia Federal, e não o ministro Sergio Moro (Justiça).

Ora, vossa excelência não manda na Polícia Federal. Vossa excelência manda no ministro de Justiça, e este manda na PF. Embora vossa excelência não esteja nas fileiras militares há 30 anos, a hierarquia invertida também deve ser cumprida. Tenente não fala com general, e general não dá ordens ao tenente.

Jair ganhou as eleições com todos os méritos de uma eleição livre e democrática. Mas, respaldado pelos militares de tropa pesada, ele parecia acreditar que tudo podia.

Acontece que, nesses últimos 30 anos, os novos generais criaram uma mentalidade de caserna fora da política. Não existe mais, nos comandos militares, o que um dia no passado existiu de desejo de participação política ativa.

Jair está exasperado e não esconde nenhuma de suas emoções. O país está nas mãos do Congresso. Se Jair vai caminhar pelas alamedas de Jânio, só o futuro dirá.

Que assim seja.

James Ackel

Jornalista e ex-conselheiro da ABI (Associação Brasileira de Imprensa)

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