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O bebê e a água

Bolsonaro se choca com a institucionalidade ao intervir em Receita, PF e Coaf

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O presidente Jair Bolsonaro, na solenidade alusiva aos 200 dias de governo, no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira - 19.jul.19/Folhapress

Agências incumbidas de fiscalizar o cumprimento das leis e de inibir nos poderosos a tendência ao abuso de suas prerrogativas atravessam um período crítico no Brasil. Tornaram-se alvo de questionamento e pressão motivados por um misto de boas e más intenções.

No centro do debate, o Ministério Público, a Polícia Federal, a Receita Federal e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) passaram por notável processo de profissionalização e modernização nas últimas décadas e têm exercido protagonismo no cerco aos crimes de colarinho branco.

A ascensão dessas burocracias não ocorreu sem custos. Fortaleceu-se nelas o corporativismo, que amiúde se expressa como autoproteção excessiva, ensimesmamento e repulsa à autocrítica. A margem e a tentação para cometer abusos em procedimentos investigativos também parecem ter crescido.

A agenda de ajustes sensata para essas agências pauta-se, portanto, na diretriz de mitigar danos colaterais do seu soerguimento sem feri-las na capacidade de investigar com autonomia e eficácia. Trata-se, em termos coloquiais, de não jogar a criança fora com a água do banho.

Enquadra-se nesse esforço bem intencionado de dar mais equilíbrio à atuação das instituições fiscalizadoras a discussão em curso sobre a lei de abuso de autoridade.

Também nessa linha, amadurece em Brasília o debate sobre uma reforma da Receita Federal que, além de esclarecer os seus protocolos de vigilância e autuação, diminua a brutal incerteza que a movimentação errática e ubíqua da máquina do fisco federal impõe sobre os negócios e os empregos no Brasil.

Já os oportunistas mal intencionados, em busca de blindagem contra investigações, se aproveitam da onda de questionamento às organizações de controle para tentar atingi-las no seu âmago.

É o que faz Jair Bolsonaro (PSL) ao atropelar etapas hierárquicas e meter-se em movimentações de cargos de chefia na PF, na Receita e no Coaf. Fica patente o ânimo de punir servidores cujo trabalho causou constrangimento a familiares do presidente da República.

Ajoelhar-se ante a tal capricho do mandatário equivaleria a retroceder ao tempo das cavernas da organização política. Fazem bem os comandos das corporações ao ameaçarem um movimento de demissão coletiva caso a sandice prospere.

Ainda assim, o rolo compressor dos expurgos presidenciais esmagou um servidor nesta segunda (19), com a substituição do número dois do fisco federal, João Paulo Ramos Fachada. O descomedimento do chefe de Estado é tamanho que cabe indagar, inclusive à Justiça, se não há desvio de finalidade do mandatário nas intervenções.

Se não recuar do modo de choque com a institucionalidade, Jair Bolsonaro terá de ser contido por ela.

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