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Sequestro no Rio

Bolsonaro e Witzel usam ação bem-sucedida da PM para reforçar discurso perigoso

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O governador do Rio, Wilson Witzel, celebra a ação da PM que encerrou o sequestro de um ônibus na porte rio-Niterói - Antonio Lacerda/EFE

Até onde se pode verificar, foi correta a ação da Polícia Militar fluminense que encerrou o sequestro de um ônibus na ponte Rio-Niterói, nesta terça-feira (20).

Atiradores de elite mataram o sequestrador, que manteve reféns o motorista e 38 passageiros por cerca de três horas e meia, no início da manhã. Tentativas de negociação haviam resultado na libertação de quatro mulheres e dois homens, mas permaneciam os riscos para as demais vítimas.

Relatou-se que Willian Augusto da Silva, 20, brandia uma pistola —que, segundo se soube depois, era de brinquedo— e demonstrava que poderia incendiar o veículo. Portava ainda uma faca, uma arma que dá choques elétricos e recipientes com gasolina.

Fazia menções, de acordo com passageiros, ao trágico episódio conhecido como o do ônibus 174, ocorrido no Rio de Janeiro em junho de 2000, quando uma ação desastrada da PM resultou na morte de uma refém pelo sequestrador —que, por sua vez, morreu asfixiado numa viatura, tendo os policiais presentes sido inocentados.

Desta vez, o desfecho traz sem dúvida alívio pela ausência de mortos e feridos entre os cidadãos que dependeram da perícia e da prudência das forças de segurança. Justifica-se, ao menos com o que se conhece das circunstâncias, o apoio das autoridades a profissionais que agiram sob enorme tensão numa situação complexa.

As ditas autoridades, entretanto, desperdiçaram a chance de fazê-lo com equilíbrio e responsabilidade, para surpresa de ninguém.

Antes mesmo do desenlace do caso, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) já defendia de público o uso de atiradores de elite: ”Não tem que ter pena”. Lamentava ainda as acusações aos policiais envolvidos na morte do sequestrador do ônibus 174, “esse vagabundo”.

Já o governador Wilson Witzel (PSC) chegou à ponte de helicóptero, do qual desceu com gestos futebolísticos de comemoração. Ao falar, tratou de defender sua tese bárbara segundo a qual portadores de fuzis devem ser abatidos sem maior questionamento.

A carona não evidencia apenas o oportunismo político vulgar de dois governantes que pouco têm de positivo a apresentar até o momento. Bolsonaro e Witzel são sobretudo propagadores de um discurso embrutecido que se busca passar, sem amparo em evidências, como receita de combate ao crime.

Desnecessário apontar os perigos de tal retórica num estado em que o número de mortos em ações policiais aumentou 15% no primeiro semestre deste ano, para assustadores 881 —o correspondente a 29% do total de casos de letalidade violenta registrados.

Trata-se de matança que, à diferença da operação desta terça, não se dá diante das câmeras de TV.

editoriais@grupofolha.com.br

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