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Direito à cesariana

Nova lei paulista sobre partos no SUS suscita debate moral, médico e econômico

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O governador de São Paulo, João Doria, que sancionou lei que facilita cesarianas no SUS - Amanda Perobelli - 21.fev.19

Ao menos três aspectos se misturam no debate —e o confundem— sobre a recém-sancionada lei paulista que autoriza realizar parto cesariano pelo SUS sem indicação médica a partir da 39ª semana de gestação: moral, médico e econômico. Convém desenredá-los.

O primeiro é o mais fácil de enfrentar. Há quem condene que certas mulheres prefiram a cirurgia ao parto normal por conveniência ou temor das eventuais sequelas da via natural. Os motivos seriam fúteis, julgam não poucos.

Tal visão está em descompasso com a noção contemporânea de autonomia do paciente, em especial da gestante sobre o seu próprio corpo. Quem defende que ela possa decidir sobre a própria continuidade da gravidez deve, por coerência, admitir que decida também sobre como vai se dar o nascimento.

Há aí uma questão de equidade. Na prática, tal opção já se encontra disponível para parturientes de nível socioeconômico mais alto: pesquisas indicam que cesáreas respondem por mais de 80% dos partos em hospitais privados do Brasil, algo como o dobro da taxa observada na rede pública.

Se pacientes e médicos elegem com maior frequência a cirurgia na rede particular, por que não estender o mesmo direito a quem depende da rede do SUS?

Decerto suscitam preocupação os dados que sugerem ser a elevada a média brasileira de cesarianas, em torno de 55%. No restante do mundo, apuram-se taxas mais próximas dos 20%.

Muito se debate qual seria um nível ideal de cesarianas, vez que as condições de saúde e socioeconômicas variam muito de país para país. A Organização Mundial da Saúde (OMS) já considerou que, se o índice fica abaixo de 10%, mulheres que precisam da cirurgia podem acabar sem o procedimento, com perigo para ela e a criança.

Entretanto se sabe hoje da dificuldade de estimar uma taxa ideal, acima da qual haveria riscos.

Tendo em conta esses limiares, parece evidente que o caso brasileiro se coloca fora da curva global. Não será restringindo o acesso de mulheres pobres às cesáreas, contudo, que se corrigirá essa distorção, e sim com melhor esclarecimento de pacientes e até profissionais de saúde sobre os benefícios do parto natural.

Por fim, cabe registrar que o governador João Doria (PSDB) sancionou a lei sem que se conheça estudo projetando qual seria o custo da extensão dessa escolha para gestantes atendidas nos hospitais do estado. Na rede pública, a oferta de serviços precisa estar condicionada aos recursos disponíveis.

editoriais@grupofolha.com.br

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