Descrição de chapéu

Verossímil em demasia

Denúncias de tortura de presos no Pará não podem ser tratadas com desdém

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Enterro de Josivan de Jesus Silva, 31, morto em rebelião em presídio de Altamira (PA) - Danilo Verpa - 31.jul.19/Folhapress

Há pouco mais de dois meses, o massacre de 62 detentos em um presídio do Pará expôs o descalabro do sistema penitenciário daquele estado, que não se limita à infame superlotação.

No local onde se deu a chacina, 343 presos se apinhavam em 163 vagas; detentos de diferentes regimes conviviam no mesmo espaço; os agentes eram insuficientes; faltavam enfermaria, biblioteca, oficinas de trabalho e salas de aula.

No fim de julho, na esteira do morticínio, o ministro da Justiça, Sergio Moro, autorizou o envio da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária ao Pará, cuja presença foi prorrogada até o fim deste mês.

Com mandato para atuar em 13 unidades do estado, o grupo tem como função “coordenar ações das atividades dos serviços de guarda, de vigilância e custódia de presos”.

Mas, em vez agir para enfrentar a precariedade vigente, a força-tarefa parece ter colaborado para tornar a situação dos presos ainda mais acabrunhante. Na semana passada, o Ministério Público Federal denunciou uma série de episódios de tortura que teriam sido perpetrados por agentes do grupo.

O documento, que se estende por 158 páginas, baseia-se em vídeos e fotos, além de depoimentos de ex-detentos, parentes de presos, servidores, representantes da OAB e do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.

Constam nele práticas hediondas, como empalamento utilizando um cabo de espingarda, perfuração dos pés com pregos, espancamentos com cassetete, uso reiterado de balas de borracha e spray de pimenta nos aprisionados, bem como disparos de arma de fogo. 

Numa penitenciária feminina, detentas nuas ou em peças íntimas teriam sido obrigadas a ficar sentadas sobre um formigueiro; uma delas, grávida, teria abortado após ser espancada.

No início do mês, a Justiça Federal do Pará, acatando pedido do MPF, afastou cautelarmente o coordenador da força-tarefa, Maycon Cesar Rottava.

Foram outras as reações dos responsáveis últimos pela operação, Sergio Moro e o presidente Jair Bolsonaro (PSL). O primeiro buscou desqualificar as denúncias, tachando-as de inconsistentes. O segundo afirmou que se tratava de besteira.

Infelizmente, é elevado o grau de verossimilhança nos relatos que descrevem os atos de barbárie. A reação indiferente das autoridades é descabida em uma democracia que zela pelos direitos humanos.

editoriais@grupofolha.com.br

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