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Chefe novo, fado velho

Conciliador, Fernández fez boa estreia na Argentina de problemas gigantescos

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O novo presidente da Argentina, Alberto Fernandez, e sua vice, a ex-presidente Cristina Kirchner - Emiliano Lasalvia/AFP

Seus desafios serão a desvalorização do peso, a dívida externa e a inflação —palavras como essas há décadas perseguem, como se fossem maldição, quase todo presidente da Argentina ao tomar posse.

Não foi diferente com o peronista Alberto Fernández, que vestiu a faixa azul e branca na terça (10), em sucessão a um fracassado Mauricio Macri. A boa nova, no sentido da longa marcha da história, é que os argentinos há 36 anos estão enfrentando as suas crises dentro das regras do jogo democrático.

O fato foi enaltecido e lembrado por Fernández logo no início da fala inaugural, que seguiu um curso de benfazeja moderação, sem descuidar das promessas distributivistas feitas ao longo da campanha.

Assim foi a mensagem doméstica do novo governante, ao conclamar uma sociedade relativamente cindida pelo processo eleitoral a unir-se em torno de objetivos comuns.

Também seguiram na via da distensão os recados dados para fora das fronteiras, seja a credores internacionais e ao FMI, seja ao presidente do Brasil, Jair Bolsonaro. Alberto Fernández disse que o sentido estratégico da parceria com o vizinho do norte supera o hiato ideológico com o homólogo brasileiro.

Se o hábito faz o monge, como atesta o ditado, a necessidade carregada de urgências e limitações econômicas da Argentina começa a remodelar um bocado o discurso inflamatório e os flertes demagógicos que marcaram a corrida eleitoral da chapa peronista.

O ministro nomeado para a Economia, Martín Guzmán, fez carreira em universidades de elite nos Estados Unidos e se especializou em crises de endividamento externo e na reestruturação dessas obrigações. São credenciais compatíveis com o novo ciclo de penosas negociações com credores internacionais por que passará a Argentina.

O desespero por dólares da economia argentina tende a fortalecer seu competitivo setor agroexportador, menos protecionista que a média das oligarquias daquele país. Por esse flanco, Brasil, Uruguai e Paraguai poderão encontrar oportunidades de convencer até mesmo o governo peronista de aderir ao programa de abertura comercial.

Por outro lado, será preciso tempo para avaliar como se comportará a ala radical dos apoiadores de Fernández, liderada pela vice-presidente, Cristina Kirchner.

O ambiente de recessão econômica, inflação de 55% ao ano e pobreza em alta pode dar aos incendiários pretexto para cobrar atitudes inconsequentes ou mesmo para a sabotagem do presidente.

Alberto Fernández, em suma, fez uma boa estreia, mas os problemas da Argentina não diminuíram em razão disso. A força necessária para o país superar sua estagnação secular continua sendo soberba.

editoriais@grupofolha.com.br

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