Esqueça a posição 79o do Brasil no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). O número mais importante deste ano é a perda de 23 posições do país no ranking do IDH quando as médias são corrigidas pelo grau de desigualdade nas diferentes dimensões do desenvolvimento humano.
A má distribuição da renda ocasiona 36,7% dessa perda. Mas não é o fator que explica a mudança no ranking. O que mudou neste ano foi a piora da distribuição na educação, que foi de 22% no ano passado para 23,8%. Esqueça a posição geral do Brasil no ranking do IDH; olhe o que está acontecendo com a distribuição da educação no Brasil, entre regiões, entre escolas públicas e privadas, entre os que podem estudar e os que não. Mas o crescimento econômico não poderia corrigir isso?
Não; esqueça. O crescimento econômico não vai resolver sozinho o problema da educação ou da pobreza no Brasil. Em um país onde o 1% mais rico ganha 28,3% da renda nacional e os 10% mais ricos tem 42%, não há como o crescimento econômico ser um efetivo instrumento de transformação social.
Similarmente, em um país onde a renda nacional dos homens é 71% mais alta do que a das mulheres, é bem mais difícil para elas usufruírem dos benefícios do crescimento econômico. Esqueça o crescimento econômico. Mas não se poderia resolver esses problemas através de uma melhoria da distribuição de renda?
Não; esqueça também que a distribuição vai melhorar, pois só piora. Medindo por onde seja há uma piora na distribuição de renda, que está levando os pobres a níveis indescritíveis de indignidade humana e empobrecendo a classe média mais rapidamente do que esta pensa.
De fato, o índice de Palma, que mede a razão entre a renda dos 10% mais ricos e a dos 40% mais pobres, aumentou de 3,5 para quase 4 vezes neste último ano. Além disso, o índice de Gini, que é sensível a variações no meio da distribuição de renda, sinaliza uma piora de 51,3 para 53,5 em apenas um ano. Isso significa que a classe média está sendo apertada. A distribuição de renda não vai melhorar por passe de mágica; olhe para os impactos perversos da polarização econômica na nossa democracia.
Mas a política não poderia resolver isso?
Não; esqueça que a política nacional é solução para algo. A política segue a reboque de assimetrias de poder encravadas em uma estrutura econômica fortemente excludente, que alimentam interesses próprios e fantasias de mudança social como estratégia de manutenção do poder.
Às vésperas de transformações tecnológicas que irão mudar o panorama do emprego no mundo, o que faz o Brasil? Intensifica o seu modelo excludente. Esqueça que a política nacional é solução para a economia ou para a sociedade.
Parece que não há como fugir: precisamos, cada um a seu jeito, encarar de frente que não há solução óbvia para nosso problema civilizatório. Olhar para nossas desigualdades pode ser, contudo, um começo.
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