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Risco de esbulho

MP que busca regularizar posses de terras no país abre brechas para infratores

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Vista aérea de área desmatada na região de Itaituba, no Pará - Ricardo Moraes/Reuters

Estima-se que cerca de 1,27 milhão de posses de terras públicas federais careçam de títulos de propriedade. Sob pretexto de regularizá-las e fazer justiça a pequenos agricultores, o governo Jair Bolsonaro baixou medida provisória com algumas brechas capazes de consagrar o esbulho de bens da União por grileiros e desmatadores.

Algo precisava ser feito com esse imenso passivo fundiário, ninguém duvida. Numa análise superficial, a MP 910, assinada na terça-feira (10), parece trilhar o caminho correto da desburocratização. Existem detalhes, contudo, que merecem exame mais detido.

A medida altera norma anterior sobre regularização, a lei 11.952/2009, que disciplinava os requisitos para regularizar por alienação (venda) ocupações anteriores a dezembro de 2004. Esse prazo já havia sido alterado para julho de 2008, no governo Michel Temer (MDB) —e agora muda de novo, para maio de 2014.

No caso da Amazônia Legal, a leniência ganha mais amplitude: antes se admitia ali a regularização de posses posteriores a 2008, havendo ocupação por ao menos cinco anos; pela MP, o prazo cai para um ano; tornam-se passíveis de regularização, portanto, imóveis ocupados até dezembro de 2018.

A brandura ruralista não para por aí. O tamanho máximo das posses regularizáveis foi aumentado de 4 para 15 módulos fiscais. Na região Norte, isso pode representar uma área de 1.650 hectares (16,5 km²), na qual caberiam dez parques como o Ibirapuera paulistano.

Por fim, a MP dispensa a vistoria prévia para comprovar as informações oferecidas por quem pleitear a compra de área federal. Em outras palavras, é considerável o risco de o Estado brasileiro alienar patrimônio público por valores baixos e premiar esbulhadores e infratores ambientais.

Não se deve ignorar que 35% do desmatamento na Amazônia acontece em terras públicas não destinadas. E houve aumento de 61% nessa modalidade de devastação entre 2018, o ano da candidatura Bolsonaro à Presidência, e seu primeiro ano de governo.

Compete ao Congresso Nacional aperfeiçoar a medida provisória recém-editada, de modo a impedir que ela regularize o processo tradicionalmente selvagem de ocupação de terras no Brasil.

editoriais@grupofolha.com.br

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