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Gustavo Bizelli

A agenda econômica pode morrer pela boca?

Resposta virá da força e da velocidade da economia

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É certo dizer que dois movimentos podem resumir o primeiro ano do governo federal. O primeiro, menos visível, é uma agenda econômica liberal. O outro, bem mais perceptível, é uma verborragia no mínimo descoordenada e desastrada.

Na agenda econômica, destacam-se aprovação da reforma da Previdência, novos acordos comerciais internacionais, como o Mercosul-União Europeia, sanção da Lei da Liberdade Econômica, imposto zero para importação de equipamentos não produzidos no país, cessão onerosa de áreas do pré-sal e encaminhamento da agenda de privatizações, da reforma tributária, da administrativa e do pacto federativo.

Gustavo Bizelli - Economista formado pela Unesp, pós-graduado pela FGV e especialista em inteligência de mercado pela Universidade da Califórnia; sócio da consultoria Diferencial Pesquisa de Mercado
O economista Gustavo Bizelli, da consultoria Diferencial Pesquisa de Mercado - Divulgação

Exceto pela reforma da Previdência, tais notícias têm baixa visibilidade, e seus efeitos são lentos, embora já estejam aí. O PIB, por exemplo, mostrou sinais de recuperação no terceiro trimestre, a construção civil reagiu em 2019, o risco-país atingiu o menor índice em nove anos, a taxa Selic de 4,5% é a menor da série histórica e o índice mensal de desemprego chegou a 11,2% em novembro —ainda alto, mas melhor do que em meses anteriores.

Por outro lado, o governo e seu entorno se esmeram em produzir reações adversas com inabilidade e truculência na comunicação.

Foi assim ao acusar ONGs de tocar fogo na Amazônia, no embate com países desenvolvidos sobre desmatamento, no cancelamento de financiamento a filmes sobre diversidade, no insulto a estudantes para explicar contingenciamento de verbas das universidades federais e na velada crítica à democracia por supostamente atrasar as reformas estruturais, entre outras pérolas.

De forma contrária à agenda econômica, a inabilidade na comunicação gera uma repercussão enorme, mas seus efeitos práticos são, no mínimo, duvidosos. É fato que a querela com os países desenvolvidos sobre o meio ambiente pode afugentar investimentos, mas, de forma geral, o grande conjunto de bobagens produzido no ano passado serve apenas para criar antagonismos.

Pode o corte do financiamento a quatro filmes sobre diversidade ter mais impacto sobre a liberdade de gênero do que as 3 milhões de pessoas na avenida Paulista durante a 23ª Parada LGBT? Pode uma infeliz frase de um filho do presidente no Twitter colocar em risco a democracia que viu 105 milhões de eleitores votarem em 2018? Apesar de inócua, pode essa verborragia impedir o avanço da economia ou as medidas liberais vão caminhar por si só?

Dependerá da robustez e da velocidade de resposta da economia. Caso a recuperação ocorra e gere bem-estar para a população, como inflação baixa, aumento de renda e emprego, é bem provável que o governo atual seja apenas classificado como um falastrão com bons resultados. Não nos é inédita tal situação, apenas de espectro ideológico invertido. 

Caso a recuperação não seja rápida e robusta, o governo poderá cair no ostracismo e a jornada liberal encerrar o seu ciclo já em 2022. 

Para aqueles que precisam tocar suas vidas e cuidar de suas famílias, sem se preocupar com a vertente ideológica do Planalto, o melhor é torcer para a economia reagir rápido —ou para a turma do governo ficar de boca fechada.

Gustavo Bizelli

Economista formado pela Unesp, pós-graduado pela FGV e especialista em inteligência de mercado pela Universidade da Califórnia; sócio da consultoria Diferencial Pesquisa de Mercado

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