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Zelo de autoridade

Corporações questionam lei que criminaliza abusos, cujas vantagens prevalecem

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Estátua simbolizando a Justiça, em frente à sede do Supremo Tribunal Federal, em Brasília - Bruno Stuckert - 8.mar.03/Folhapress

Associações de magistrados, procuradores, policiais e auditores contestam no Supremo Tribunal Federal a constitucionalidade de 20 pontos da nova lei de abuso de autoridade, em fenômeno que pode mais parece uma batalha de corporações por símbolos.

Afinal, as categorias queixosas estão relativamente protegidas do mau uso do novo diploma —que passa a vigorar nesta sexta (3)— pelo simples fato de que as eventuais punições precisarão do aval do Ministério Público e do Judiciário.

Nesse cenário, o inafastável espírito de corpo já tende a funcionar como um filtro poderoso, a fazer com que apenas abusos escabrosos resultem em condenações.

Cada setor tem suas reclamações específicas. Magistrados, por exemplo, questionam com maior ênfase o artigo 9º, que criminaliza decretar prisão “em manifesta desconformidade com as hipóteses legais”. Existe algo de tautológico no texto, uma vez que a norma, basicamente, afirma que prisões ilegais são ilegais.

A novidade, cujo emprego deve se dar com grande parcimônia por parte dos próprios juízes, consiste em uma sanção penal (detenção de um a quatro anos e multa), e não apenas administrativa, como acontecia até aqui.

O único ponto contestado por todas as seis ações diretas de inconstitucionalidade, movidas por sete associações, é o artigo 43, que torna crime violações a prerrogativas de advogados, em outro front da guerra entre corporações.

A lei nº 8.906/94, que define tais prerrogativas, combina proteções necessárias ao exercício profissional com minudências basicamente destinadas a inflar o status da advocacia, como desagravos públicos e o reconhecimento de símbolos privativos da atividade.

A nova lei de abuso (nº 13.869/19) traz, sem dúvida, trechos muito abertos ou passíveis de subjetivismos, mas de fato se fazia necessário atualizar a legislação.

A peça anterior datava de 1965, na ditadura militar, e tinha o objetivo velado de dar amplitude às ações de órgãos repressivos. O novo diploma, em que pesem problemas, é substancialmente melhor.

Na pior hipótese, pode ser que, num primeiro momento, agentes da lei se vejam sob uma enxurrada de processos com base na nova norma às quais terão de responder, perdendo precioso tempo remunerado com recursos públicos.

Essa, contudo, tende a ser uma fase transitória. À medida que a jurisprudência se firmar, e se perceberem os tipos de ação fadados ao fracasso, o volume de contestações deve estabilizar-se.

Ministério Público e Judiciário tendem a proteger-se e a seus colegas de áreas afins, mas a simples existência de uma legislação mais detalhada já deve fazer com que autoridades sejam mais cautelosas em seus procedimentos, que é exatamente o que se deseja.

editoriais@grupofolha.com.br

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