O principal indicador para a solvência das contas públicas apresentou ligeira melhora no ano passado, interrompendo uma trajetória explosiva que ameaçava todo o projeto de estabilização da economia brasileira a partir do Plano Real, de 1994.
Pela primeira vez desde 2013, a relação entre o montante da dívida pública bruta e o tamanho da economia —o PIB— caiu, encerrando o ano em 75,8%. Em 2018, o indicador havia ficado em 76,5%.
A queda interrompe, ao menos por ora, uma escalada explosiva do indicador —que há seis anos estava próximo de 50% do PIB— e o círculo vicioso que jogou o país em uma de suas piores recessões.
Ao disparar —o salto foi de 9,2 pontos só de 2014 a 2015—, o indicador fez o setor privado retrair-se na expectativa de que, entre outras medidas de equilíbrio, haveria forte aumento de impostos. Como a dívida é calculada como proporção do PIB, que encolheu na recessão, o ciclo negativo foi reforçado.
Assim, a quebra nessa dinâmica não deixa de ser boa notícia. Mas, como o diabo mora nos detalhes, eles mostram que, sem algumas receitas extraordinárias, em 2019 o indicador teria piorado outra vez.
Caso o BNDES não houvesse antecipado a devolução de R$ 121,7 bilhões ao Tesouro e o Banco Central não tivesse levantado outros R$ 137,7 bilhões vendendo parte das reservas em dólar, a dívida pública bruta teria ultrapassado R$ 5,7 trilhões e atingido 79% do PIB —bem acima, portanto, dos R$ 5,5 trilhões equivalentes aos 75,8% do PIB no fechamento do ano passado.
Outro fator importante foi a diminuição do juro incidente sobre a dívida. Mas, além de ser influenciado por um cenário global inédito de taxas muito baixas, sua perpetuação depende da expectativa de queda na relação dívida/PIB.
Do ponto de vista estrutural, o teto dos gastos, de 2016, e a reforma da Previdência, de 2019, foram cruciais para conter o endividamento. Estima-se, no entanto, que ainda seja necessário um resultado fiscal sem receitas e despesas extraordinárias de 1 ponto do PIB para estabilizar a relação dívida/PIB —o indicador hoje é negativo em -1,6 ponto.
É preciso, portanto, aprofundar o ajuste e a busca de eficiência na máquina pública para abrir mais espaço para o investimento estatal e o crescimento inclusivo.
Com cerca de 93% do Orçamento já comprometidos apenas com gastos obrigatórios, porém, não resta saída a não ser aprovar a chamada emenda constitucional da emergência fiscal a fim de limitar as despesas, sobretudo com servidores.
Sem isso, a melhora na relação dívida/PIB do ano passado terá sido apenas pontual e passageira.
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