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Ana Paula Vescovi

O modelo de estabilidade do servidor público deve ser revisto? SIM

É preciso arejar o setor e pensar mais na sociedade

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Ana Paula Vescovi

A revisão do modelo de estabilidade no serviço público do país contribuiria, ao mesmo tempo, para o uso mais eficiente de recursos e para alinhar os servidores a políticas públicas mais resolutivas —e, assim, produzir maior equidade. 

No Brasil, são mais de 50 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, extremamente dependentes dos serviços públicos. O Estado deveria ser provedor de bem-estar e de oportunidades para superar a pobreza, para empreender, inovar e prosperar, em vez de ser um provedor de empregos, praticamente vitalícios.

A economista-chefe do Santander Brazil, Ana Paula Vescovi - Valter Campanato - 18.set.18/Agência Brasil

Dentro dos serviços públicos há funções exclusivas do Estado, tais como a diplomacia, o Judiciário, as Forças Armadas, a arrecadação de tributos, a fiscalização, o controle e a gestão das finanças, dos orçamentos e da dívida pública e a manutenção da estabilidade monetária. São atividades que não se encontram na iniciativa privada. Mas há funções que podem ser concomitantemente providas pelo setor privado, como as administrativas, que podem ser delegadas a organizações da sociedade civil mediante regulação do Estado. São exemplos a gestão hospitalar e educacional e a manutenção de parques e vias urbanas.

Para os servidores incumbidos das funções exclusivas do Estado faz sentido a estabilidade, a fim de assegurar sua independência em relação aos governos e aos ciclos políticos. Ainda assim, a estabilidade deveria estar vinculada ao interesse coletivo e não aos interesses das corporações. Deveria estar condicionada ao estrito cumprimento da função social e de suas prerrogativas, com metas de desempenho e avaliação externa. E deveria estar associada a um direito de greve equilibrado, capaz de assegurar o atendimento contínuo dos serviços públicos ao impedir que o Estado seja capturado, e a sociedade, chantageada.

Para o grupo de servidores em funções também exercidas pelo poder privado, não há sentido haver estabilidade, ainda que sejam selecionados por concurso público. Haveria ganhos para a população em geral e para os servidores caso o serviço público pudesse ser arejado por meio de trocas de posições com o setor privado. Neste sentido, a definição de regras claras seria imprescindível para que as mesmas fossem avaliadas previamente pelos novos postulantes ao serviço público.

Com regras iguais de contratação e remuneração, dentro do regime celetista, poderia haver maior reconhecimento do mérito, remunerações mais convergentes e mais bem calibradas, além de complementariedade. A experiência no setor público proporciona o conhecimento dos imensos desafios trazidos pela limitação de meios e múltiplas carências sociais. Por outro lado, o setor privado proporciona a experiência do uso mais flexível e eficaz dos recursos. Em ambos os casos, poderia haver troca mais intensa de experiências, métodos e tecnologias em favor da saúde, educação e mobilidade urbana, por exemplo, com maior qualidade e resolutividade.

Diante da limitação de recursos, somente uma gestão mais eficiente e arejada conduzirá a uma melhor prestação de serviços. Para isso, a estabilidade deveria existir apenas para funções exclusivas do Estado e para servidores com avaliação positiva de desempenho, mas com direitos compatíveis com a preservação dos serviços e do interesse social. 

Seria uma revolução silenciosa em favor do Brasil.

Ana Paula Vescovi

Economista-chefe do Santander Brazil, ex-secretária do Tesouro Nacional (2016-18) e ex-secretária-executiva do Ministério da Fazenda (2018)

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