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Ambições czaristas

Em manobra por novo mandato, Putin degrada ainda mais a democracia na Rússia

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O presidente russo, Vladimir Putin, em sessão da Duma - Alexey NikolskyAFP

Nunca houve muita dúvida de que Vladimir Putin, dado o seu apetite pelo poder, buscaria manter-se no comando da Rússia após a atual Presidência —sua quarta e, de acordo com a Constituição, sem possibilidade de reeleição.

A questão sempre foi como ele faria isso. Nesta semana, o líder russo descerrou as cortinas e apresentou seu plano ao público.

A estratégia começou a ser visível em janeiro, quando o mandatário, de maneira inesperada e casuística, reformou o governo, retirando do cargo de premiê o antigo aliado Dmitri Medvedev, e propôs um referendo com o objetivo de emendar a Carta Magna.

Naquele momento, especulou-se que Putin, há 20 anos no poder, buscaria manter o domínio por meio de algum arranjo criativo, como tornar-se uma espécie de “superpremiê”, com um Parlamento fortalecido, ou comandar um redivivo Conselho de Estado, com poderes ampliados.

Na terça-feira (10), contudo, soube-se que ele tem em mente um passo mais simples e direto —continuar disputando a Presidência. Para dar forma à manobra, o líder russo promoveu um balé político que teve início na Duma, a Câmara baixa do Parlamento, durante a votação da reforma constitucional.

Na sessão, uma deputada do partido governista apresentou uma proposta até então inédita: os mandatos presidenciais deveriam ser zerados com a nova Carta, abrindo, assim, espaço para o presidente se candidatar novamente em 2024 e repetir a dose em 2030.

Em seguida, o próprio Putin subiu ao palco legislativo. Sua rara visita à Duma, explicou, devia-se ao propósito de falar “sem demora” aos parlamentares.

Em discurso transmitido pela televisão, afirmou que apoiava a proposta de disputar um novo pleito, e defendeu que, embora a Rússia deva se transformar em um país no qual o presidente mude regularmente, ela ainda não está preparada para tais mudanças, em razão de ameaças externas e domésticas à estabilidade do Estado.

Buscou ainda dar fumos legalistas à discussão, ao declarar que só aceitaria a possibilidade de continuar concorrendo se a corte constitucional concluísse que a emenda se coaduna com a Carta —praticamente uma formalidade, dado o controlado sistema político.

Com cinismo, Vladimir Putin vai trilhando o caminho de líderes autoritários das mais diversas regiões e matizes ideológicas —o uso de capital político para mudanças legais destinadas ao prolongamento de mandatos. Degrada, com isso, a democracia em seu país.

editoriais@grupofolha.com.br

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