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Congresso emergente

Altivez do Legislativo é desejável, assim como acordos políticos para a agenda

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O Congresso Nacional (esq.) e o Palácio do Planalto, em Brasília - Mateus Bonomi/Agif/Folhapress

Em seus registros diários nos tempos de presidente, depois convertidos em livros, o tucano Fernando Henrique Cardoso se queixa com frequência da pequenez das demandas parlamentares por cargos e verbas nas negociações em torno de reformas cruciais.

Não obstante, FHC se tornou referência na formação de coalizões multipartidárias capazes de minimizar riscos políticos. E não por acaso, dado que o presidente eleito anterior havia sucumbido a um processo de impeachment.

O modelo foi levado ao paroxismo pelo petista Luiz Inácio Lula da Silva, que reuniu em torno de si um arco de forças ainda mais heterogêneas —do qual fez parte até o hoje presidente Jair Bolsonaro, então deputado pelo Rio de Janeiro.

Ao longo de duas décadas, que incluíram ainda o primeiro governo de Dilma Rousseff (PT), tal arranjo prevaleceu como a forma mais viável de governar em meio ao quadro partidário hiperfragmentado originado da redemocratização.

Cabia basicamente ao Palácio do Planalto ditar a agenda nacional; para tanto, contava-se com o poder da caneta presidencial na liberação de recursos orçamentários e nas nomeações. Ministérios eram criados para acomodar aliados; ações de governo surgiam para contemplar projetos paroquiais de deputados e senadores.

Os congressistas aceitavam de bom grado seu papel subalterno, que garantia benefícios sem maiores responsabilidades. Encontrar dinheiro para fechar as contas, afinal, era problema do Executivo.

Como assinalou reportagem desta Folha, vivemos outros tempos desde o impeachment de Dilma e, sobretudo, com a recusa de Bolsonaro em participar do jogo político —por ele associado de modo caricatural e temerário à corrupção.

Foi interessante, sem dúvida, ver o Congresso a rejeitar medidas provisórias abusivas e a assumir protagonismo na condução da reforma da Previdência, mesmo que tenha sido movido mais pelo imperativo da sobrevivência do que por alguma estratégia programática.

Há méritos, também, na busca por maior controle da execução do Orçamento, ora objeto de conflito com o Planalto. Nesse caso, porém, a ofensiva se mostra açodada: tal avanço deveria ser precedido por um novo desenho do processo orçamentário, no qual o Legislativo também tivesse de zelar pela solidez das finanças públicas.

São desejáveis tanto um Congresso altivo quanto acordos políticos amparados mais na negociação da agenda de governo do que em favores fisiológicos. Parece difícil prever os desdobramentos da atual crise do modelo, mas uma queda de braço permanente entre dois Poderes decerto não se afigura um caminho promissor.

editoriais@grupofolha.com.br

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