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Pesquisa capenga

Governo mostra visão indigente do fazer científico ao fixar critérios para verba

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O ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes - Pedro Ladeira - 6.ago.19/Folhapress

Duas decisões recentes, tomadas no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia e da Capes, órgão de fomento ligado à pasta da Educação, aprofundam equívocos da administração Jair Bolsonaro a respeito da pesquisa científica.

A primeira, publicada em portaria do ministério, estabelece as áreas que deverão ser priorizadas, de 2020 a 2023, no que tange à alocação de recursos para projetos.

A listagem contempla apenas campos tecnológicos e aplicados, deixando de lado as ciências humanas e sociais, bem como as ciências básicas. Se, no primeiro caso, o documento apenas reafirma a notória repulsa ideológica do governo às humanidades, no segundo revela-se uma visão estreita e mal informada do fazer científico.

A ciência organiza-se numa espécie de linha contínua que vai das áreas puramente teóricas àquelas voltadas estritamente à resolução de problemas concretos. Ao privilegiar apenas as últimas, o ministério parece ignorar a relação inextricável entre estas e as primeiras.

Tome-se a decifração da estrutura de dupla hélice do DNA, ocorrida em 1953. Seria, à primeira vista, um típico caso de busca do conhecimento pelo conhecimento. A descoberta, porém, tornou-se uma das bases da biotecnologia moderna, com aplicações nas áreas de saúde e energia e nas indústrias química e alimentar, entre outras.

As falhas da portaria se devem, talvez, à maneira como foi elaborada, sem consulta à comunidade científica, como apontaram entidades em carta ao ministério.

O mesmo expediente foi seguido nas mudanças efetuadas pela Capes nos critérios de distribuição de bolsas de pesquisa. Um mês após introduzir um novo sistema, a agência, de forma inexplicável, alterou novamente as regras.

Agora, os programas podem perder até 50% das bolsas que possuíam, ante o limite de 10% no regramento anterior. De um dia para o outro, milhares de pós-graduações se viram com um número menor de bolsas do que o esperado, com prejuízo não apenas para o planejamento anual como para os estudantes que iriam recebê-las.

A iniciativa mereceu amplo rechaço, que incluiu o dos 49 coordenadores de área da própria Capes, bem como as associações universitárias e as entidades científicas.

Somadas, ambas as medidas têm o potencial de desestabilizar o sistema de pesquisa e pós-graduação erigido nas últimas décadas. Devem ser revistas o quanto antes.

editoriais@grupofolha.com.br

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