Descrição de chapéu

São Paulo pode parar

Não se descarta paralisação contra coronavírus, mas falar em prisão é exagero

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O médico David Uip, em entrevista coletiva - Governo do Estado de Sao Paulo

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), excedeu-se na retórica ao ameaçar com prisão pela Polícia Militar cidadãos que violarem as regras de quarentena e resistirem à determinação dos agentes para se recolherem.

A retomada recente de atividades por muitos paulistas de fato preocupa. Epidemiologistas projetam que, com menos de 50% de adesão ao isolamento, faltarão leitos para doentes graves no estado de São Paulo. Não se justifica, porém, o recurso extremo.

O político tucano parece mais empenhado em cultivar imagem de comando e firmeza do que em liderar e convencer a população que o elegeu. Não será com ameaças a direitos fundamentais que alcançará o objetivo —acertado, reitere-se­— de manter o máximo de pessoas em casa.

Verdade que a lei admite recurso à coerção, mas em caráter auxiliar. Mesmo que no limite se parta para a prisão, parece certo que as afinal realizadas acabarão relaxadas, dado o baixo potencial ofensivo da desobediência.

Força coercitiva não se exerce só com repressão e violência. Antes vêm prevenção, orientação e, sobretudo, convencimento.

Fará sentido pôr policiais nas ruas, se e quando o chamado “lockdown” (paralisação completa) se impuser, para verificar se cada pessoa encontrada na rua tem autorização para tanto. A PM poderia até conduzir algum desobediente a uma delegacia para lavrar auto circunstanciado, mas o constrangimento deveria terminar por aí.

Antes de baixar a medida draconiana, o governador paulista precisaria explicar com mais transparência quais são os dados que servem de base para adotá-la —em especial os relativos à adesão ao isolamento e à capacidade das UTIs.

Na falta deles e de esforço mais amplo de comunicação com os governados, Doria se torna presa fácil do discurso demagógico do presidente Jair Bolsonaro contra o distanciamento social.
Bolsonaristas já fazem disso cavalo de batalha para antagonizar o rival paulista do presidente, assim como no caso da cloroquina.

Aqui também Doria e sua equipe ficaram a dever na obrigação de informar quando o médico David Uip, na chefia do comando estadual da crise, recusou-se a dizer se tomou o medicamento em sua recuperação da Covid-19.

Ao optar pela confidencialidade, uma prerrogativa de paciente que neste caso é suplantada pelo interesse público, repete a atitude de Bolsonaro de omitir os resultados de seus testes de coronavírus.

Caberia esclarecer se a prescrição ocorreu e em quais circunstâncias, ou o segredo poderá alimentar a desconfiança de quem começa a se arriscar nas ruas.

editoriais@grupofolha.com.br

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