O novo coronavírus ataca a saúde, devasta a economia e, por vezes, pode atingir a democracia.
Assim como existem pacientes assintomáticos e aqueles com quadros críticos, também países experimentarão sintomas em diferentes graus. Se, na esfera sanitária, a Itália parece ter sido a nação mais gravemente afetada, na política a Hungria foi a que mais se afastou da normalidade democrática
O premiê Viktor Orbán, que já pode ser qualificado como um autocrata, conseguiu do Parlamento uma lei de emergência para lidar com a epidemia que lhe dá o direito de governar por decreto durante tempo indeterminado.
Ganhou poderes especiais para suspender sessões parlamentares e eleições; para prender, por até oito anos, quem desrespeitar as regras de quarentena; pior, para prender, por até cinco anos, quem divulgar informações que o governo considere incorretas —medida já apontada como a morte do que restava de liberdade de imprensa no país.
A Hungria decerto constitui um caso exacerbado de retrocesso político, mas não o único. Outros líderes aproveitaram a pandemia para aprovar leis ou baixar medidas duvidosas, que ferem muito mais a democracia do que o vírus.
Em Israel, o premiê Bibi Netanyahu determinou o fechamento das cortes, adiando, assim, seu comparecimento ao tribunal para responder por acusações de corrupção. Na Tailândia, o governo ganhou poderes para censurar a mídia. No Reino Unido, para manter pessoas presas indefinidamente.
Ninguém ignora que estejamos em tempos excepcionais —que requerem medidas extraordinárias. Mas nada há no caderno dos epidemiologistas que sugira a necessidade de censura à imprensa ou de quebras nos mecanismos que mantêm o equilíbrio de Poderes.
Ao contrário, para que a população acate as políticas de enfrentamento da doença, é preciso que elas inspirem confiança —que sejam as estritamente necessárias para lidar com a situação e tenham uma duração claramente limitada.
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