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Fernando Holiday

A direita que não vê racismo

Áudios de Sérgio Camargo são o suprassumo do monstro que criamos

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Fernando Holiday

Criamos uma direita que nega o racismo. Um exemplo é o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, que acredita que séculos de escravidão foram benéficos aos negros. O órgão responsável por guardar a história afro-brasileira se preocupa em criar selos para proteger pessoas acusadas de racismo, enquanto não se move em casos como o da aluna Ndeye Fatou, que recebeu mensagens do tipo: “Escravo não pode. Ela não é gente”.

Tudo isso vai além quando nos deparamos com áudios de Camargo criticando o movimento negro e Zumbi dos Palmares com baixarias. Eis aqui o suprassumo da ignorância do monstro que criamos, e que não representa a maioria da direita, razão pela qual escrevo este artigo.

O vereador paulistano Fernando Holiday (Patriota) em ato solene em memória às vítimas do Holocausto, na sinagoga Etz Chaim, em São Paulo - Greg Salibian - 27.jan.20/Folhapress

Nunca escondi críticas ao movimento negro, que defende as cotas raciais como método de superação de distorções. A meu ver, a defesa que fazem prejudica a luta a que se propõem e submete pessoas negras à humilhação, com comissões criadas para avaliar se cotistas são negros “de verdade”. De outro lado, critico a escolha de Zumbi como homenageado no Dia da Consciência Negra, devido às poucas referências históricas em torno do personagem, além da criação de um mito sem nexo criado, principalmente, por Décio Freitas no livro “Palmares, a Guerra dos Escravos”. Apesar disso, a Fundação Palmares, com a sua atual presidência, consegue transformar discussões sérias em uma rivalidade brutal e nada embasada.

Criticar o movimento negro implica conhecer sua história e importância que teve, não somente nos movimentos abolicionistas como após a escravidão. Os poucos que conseguiram se organizar no início do século 20 passaram a existir principalmente porque o negro tinha dificuldades em lidar com as relações trabalhistas. Não havia sido preparado para a liberdade e, por isso, como por outros motivos, acabou tendo seus empregos tomados pelos imigrantes. E, para formular críticas a Zumbi, é preciso que não se cometa anacronismos e se compreenda as realidades sociais africanas, que também tinham sistemas escravocratas em meados do século 17.

Todos esses fatores deveriam ser de conhecimento da Fundação Palmares; aliás, deveria ser o seu dever promover esse conhecimento para alimentar um debate responsável. Todavia, quem dominou esse tema na direita não se preocupou em estudar a história. Eles não leram as inúmeras obras que tratam da dificuldade de integração dos negros na sociedade semicapitalista brasileira após a abolição da escravidão.

Por fim, negam o racismo, como se fosse uma criação da esquerda. Ignoram as inúmeras obras sobre a formação da identidade brasileira porque têm repulsa da academia.

Isso deve servir de alerta para quem não se cegou na disputa política: falhamos ao não buscar o diálogo e, acredito, o movimento negro falhou ao se render completamente à esquerda.

Não podemos abandonar o pressuposto de que o racismo existe. Precisamos aceitar que discutir —com embasamento— o fim das cotas raciais ou questionar a figura de Zumbi não torna alguém racista (ou “capitão-do-mato”). E, finalmente, a Fundação Palmares necessita de uma direção que a recoloque em seu papel histórico; o movimento negro deve reencontrar a tolerância de Martin Luther King; e a direita prudente não pode ignorar esse debate.

Fernando Holiday

Vereador por São Paulo (Patriota), é membro do Movimento Brasil Livre e estudante de história

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