O Brasil se tornou relevante no mercado de testes de vacinas contra a Covid-19 —em certa parte por seus méritos, mas sobretudo pelo fracasso em achatar a curva de avanço dos contágios.
Dois dos imunizantes mais promissores, um produzido pela Universidade de Oxford em parceria com o laboratório sueco-britânico AstraZeneca e o outro pela companhia chinesa Sinovac, terão parte de sua fase 3 de testes, a última antes da aprovação, realizada no país.
Uma parcela do interesse em realizar os testes por aqui está relacionada à boa estrutura médico-laboratorial disponível, que permite acompanhar de perto os voluntários, submetendo-os aos exames necessários para monitorar possíveis efeitos colaterais.
No caso do consórcio europeu, a parceria para a testagem é com a Universidade Federal de São Paulo; no da firma chinesa, com o Instituto Butantan, vinculado ao governo estadual paulista.
Também é conveniente para as farmacêuticas associar os testes, e eventualmente seus custos, a acordos de transferência de tecnologia para a produção em massa da vacina, caso ela se mostre viável —e o Brasil tem boa capacidade de fabricação, por meio do Butantan e da Fundação Oswaldo Cruz (laboratório Farmanguinhos).
No caso da iniciativa chinesa, o acordo com o Butantan já está firmado; no da europeia, um acerto com o Ministério da Saúde para produção em Farmanguinhos deve ser assinado nos próximos dias.
Lamentavelmente, porém, o grande atrativo que leva as farmacêuticas a procurarem o Brasil não reside em virtudes, mas no fato de que o vírus ainda circula com força por aqui, o que torna o processo de testagem da eficácia da vacina bem mais rápido e robusto.
Na Europa, é cadente o número de novos infectados; na China, o vírus está praticamente controlado. Estas não constituem as condições ideais de teste de uma vacina.
É positivo que os governos federal e paulista estejam se mobilizando para assegurar que o Brasil tenha acesso a vacinas tão logo elas recebam aprovação. As autoridades não podem se acomodar, entretanto. A taxa de fracasso de vacinas, mesmo das que chegam à fase 3, mostra-se elevada.
Para que o país não fique a ver navios, cumpre traçar planos alternativos com outras entidades em estágio avançado de desenvolvimento da vacina, além de já preparar a estrutura de produção em massa do imunizante. Por mais experiência que se tenha, não é trivial produzir mais de uma centena de milhão de doses e aplicá-las.
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