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Alexandre Agra Belmonte

A correção de dívidas trabalhistas pela TR deve ser derrubada pelo STF? SIM

Taxa é imprestável para recompor o poder real dos valores devidos ao credor

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Alexandre Agra Belmonte

Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, é doutor em direito e presidente da Academia Brasileira de Direito do Trabalho

A atualização monetária visa corrigir a perda do valor aquisitivo da moeda. Difere dos juros legais da mora, que têm por fim remunerar o tempo de utilização do capital alheio.

A Taxa Referencial (TR) foi criada para servir de referência mensal para as demais taxas de juros no Brasil, numa tentativa de controlar a inflação durante o governo Fernando Collor (1990-1992). É calculada sobre a média ponderada das taxas de juros pagas diariamente pelos CDBs prefixados das 30 maiores instituições financeiras do país, resultando na Taxa Básica Financeira (TBF).

A taxa Selic hoje desempenha esse papel de controle, mas a TR continua sendo utilizada como parte da indexação de ativos, entre eles as dívidas trabalhistas.

Ocorre que a TR não pode ser adotada como critério de atualização do poder aquisitivo da moeda, a uma por ser prefixada, ao passo que o índice de inflação para correção monetária é sempre pós-fixado e varia em função da variação dos preços da cesta básica; a duas, por ser calculada com base em taxa de juros, e não na depreciação do valor da moeda.

Logo, a TR é imprestável para recompor o poder real dos valores devidos ao credor e que venham a ser deteriorados pela inflação.

Se o STF já decidiu que para efeito de pagamento de precatório (dívidas do Estado) a TR não serve de atualização, porque inconstitucional por ferir o direito adquirido de propriedade do crédito, por que serviria para a atualização de um débito trabalhista que tem, tal como o precatório, caráter alimentar?

Além do mais, se os juros legais pagos aos particulares pelo Estado em débitos apurados em processo são menores do que os pagos nas relações privadas, e o STF determina a atualização monetária em valor superior, calculado sobre o IPCA-E para os débitos do Estado com os particulares, por que então seria, numa inversão de valores, aplicável uma atualização menor nas relações privadas trabalhistas?

O IPCA-E visa a restitutio in integrum (recomposição integral), para a recomposição total e correta do poder aquisitivo do valor correspondente ao crédito, deteriorado com o passar do tempo.

Juros e atualização monetária incidem sobre a propriedade do crédito devido, só que um para recompor o valor da propriedade e outro para efeito de remunerar a sua utilização por outrem. Não podem ser confundidos.

Na prática, diante da enorme distância percentual entre a TR anual e o IPCA-E, em vez de o trabalhador receber de forma atualizada o seu crédito, a empresa é que está se capitalizando com a demora no pagamento, fazendo com que o passivo trabalhista se transforme em investimento. Ou seja, pagar R$ 5 mil cinco anos depois resulta, na prática, em pagar R$ 3,5 mil, ganhando a empresa com isso R$ 1,5 mil se atrasar o pagamento, ao servir-se para isso do embate judicial.

Compreendo, no entanto, que a taxa de juros esteja alta para o atual momento da economia e deva ser ajustada para 0,5% ao mês. Mas não é bebendo álcool em gel que se revolve uma pandemia.

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