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Marcos Fernandes G. da Silva

Universidade pública paga?

É socialmente injusto oferecer gratuidade à parcela mais rica da sociedade

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Marcos Fernandes G. da Silva

Professor de economia da FGV/Eaesp e pesquisador do FGV/Ethics

Pesquisa Datafolha mostrou que a maioria da população brasileira quer educação gratuita para todos, da creche à universidade.

Educação deve ser pública e gratuita, da primeira infância ao ensino médio. Por exemplo, uma menina que passar por esse ciclo gerará um retorno social maior que o privado: a produtividade da economia aumenta com trabalhadores qualificados.

Marcos Fernandes G. da Silva - Professor de economia da FGV/Eaesp e pesquisador do FGV/Ethics
O professor de economia Marcos Fernandes G. da Silva, da FGV/Eaesp - Divulgação

Há justificativa moral para a gratuidade: ela confere liberdade às pessoas. No processo educacional, funcionalidades são apropriadas pelos indivíduos, conferindo-lhes a possibilidade de serem livres e agentes, não dependentes e passivos. É a posição de Amartya Sen, no meu entender correta, de que a liberdade deve ser a real, econômica, e não apenas a da filosofia política em geral, meramente formal.

No ensino superior, o retorno privado é maior do que o social. Por exemplo, mais médicos e administradores graduados geram ganhos sociais, mas os salários desses profissionais indicam que os ganhos privados são substantivos: não seria razoável oferecer-lhes educação superior gratuita.

Há aspectos morais que justificariam ensino superior pago, mas somente para quem tem capacidade de fazê-lo. O Brasil é um país consideravelmente desigual. Logo, desiguais deveriam ser tratados desigualmente. E há dois fundamentos filosóficos para tal posição.

O primeiro advém do conceito de progressividade de impostos e gastos públicos. Logo na graduação, economistas aprendem um princípio de justiça retirado de “Crítica ao Programa de Gotha”, de Karl Marx: de cada um de acordo com sua capacidade, a cada um de acordo com sua necessidade. Não adianta cobrar mais impostos, de forma progressiva, se o gasto é regressivo. O segundo é derivado da visão do filósofo John Ralws: por vezes, é mais justo tratar desiguais de forma desigual.

Logo, seria mais razoável, do ponto de vista econômico e moral, considerar que alunos do ensino superior que possam pagar pelo ensino superior o façam.

O economista Sergio Firpo fez nesta Folha breve análise sobre o perfil de renda dos alunos da Universidade de São Paulo (dados de 2014): 50% dos estudantes ingressantes naquele ano estavam no quinto mais elevado da distribuição de renda do país. É socialmente injusto oferecer gratuidade os mais ricos, que estudaram em escolas privadas de melhor qualidade, cujos pais, inclusive, abateram por anos gastos com educação do Imposto de Renda.

A política pública adequada ao ensino superior deveria ser cobrar de quem pode pagar e usar este recurso para um fundo solidário composto pelo pagamento de mensalidades.

Na prática, há como se fazer um sistema de pagamento. Usando-se critérios de renda per capita familiar, seria viável estabelecer graus de capacidade e necessidade e níveis de pagamento, variando da total gratuidade com subsídio (aos mais vulneráveis), passando por gratuidade, faixas de pagamento variáveis, até chegar à mensalidade total.

O fato é que economistas devem informar à sociedade não somente os custos de oportunidade de cada real gasto em políticas públicas, mas também os aspectos normativos e morais implícitos às mesmas.

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