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Morgan Doyle

Crédito às empresas: desafio global que requer reflexões

Sociedade deve estar ciente de que parte dos recursos não será devolvida

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Morgan Doyle

Cidadão norte-americano, é mestre em desenvolvimento internacional e representante do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no Brasil

O desafio é global: diante da maior crise econômica recente, empresários, sobretudo pequenos e médios, relatam dificuldades para obter crédito. A situação não é exclusiva do Brasil, mas as sequelas aqui preocupam: nosso tecido produtivo tardará mais para se recompor pelo tempo e pelo custo para abrir uma empresa no país.

O cenário, portanto, requer medidas contundentes. Nesse contexto, especialistas de instituições multilaterais como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), do governo, da academia e do setor produtivo têm se reunido virtualmente para buscar saídas.

O ponto de partida é entender que, diferentemente de uma usual recessão, em que estímulo ao gasto e investimento devem ser priorizados, neste momento o foco deve ser a sobrevivência de pessoas e empresas.

A discussão reconhece que, enquanto programas como o auxílio emergencial de R$ 600 para pessoas físicas adotado pelo governo brasileiro tiveram, apesar de alguns percalços, forte alcance, as ajudas às empresas ainda não alcançaram sua maior efetividade. Por isso, é preciso agir para evitar a destruição de empresas viáveis e necessárias no médio prazo, mas talvez incapazes de sobreviver sem ajuda agora.

Estudo apresentado pelo professor Jeremy Stein, da Universidade de Harvard, aponta alguns princípios para que governos ajam nesse contexto. Ele sugere a liberação de crédito fracionado, em quantidade suficiente para as empresas sobreviverem por alguns meses e reavaliação regular de acordo com a evolução da pandemia. É importante que os valores estejam disponíveis para o maior número possível de empresários.

Outros pontos que emergem no debate é que não se podem impor requerimentos de crédito excessivamente rigorosos —ou poucos terão acesso. Também deve-se tentar, sempre que possível, atrasar o máximo possível o pagamento da dívida, e recomenda-se limitar bônus aos executivos e à distribuição de lucros.

Diversas dessas medidas estão em curso ou em análise no Brasil e em diversos países cujos bancos centrais adotaram medidas para que o crédito flua para o setor produtivo. Ainda assim, muitas pequenas e médias empresas ainda se queixam de que o acesso à ajuda está difícil e caro. Esse fato sugere que ainda há espaço para que os governos assumam uma maior parte do risco de crédito.

Mas mesmo essa saída impõe impasses a serem resolvidos: Quanto do risco de crédito deveria ser absorvido pelo governo, especialmente pelo Tesouro? Aliás, é prudente para o poder público expor suas finanças em um momento cheio de incertezas como este?

As respostas dependem de diferentes fatores e exigem um pacto com a sociedade, que deve estar ciente e disposta a arcar com a parcela dos recursos que inevitavelmente deixará de ser devolvida. No meio de uma pandemia, não há tempo hábil para identificar com exatidão quais são as empresas que naufragarão mesmo com o auxílio (e não conseguirão pagar o dinheiro público tomado) e quais são aquelas que só precisam de capital de giro para concluir a travessia desse período turbulento.

Outro ponto crucial no caso brasileiro é que a sustentabilidade fiscal pública precisa ser levada em conta. Uma recuperação forte no pós-pandemia dependerá da manutenção do equilíbrio das finanças públicas.

É claro que a conta a ser feita é muito mais complexa e que outros pontos precisam voltar à pauta do dia assim que possível, como é o caso das reformas fiscais, do aumento da produtividade brasileira e da revisão do modelo de proteção social. São desafios para os quais ainda não há respostas, mas há urgência. O BID segue trabalhando em parceria com atores públicos e privados para chegar às melhores soluções possíveis.

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