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Celso Napolitano

Há condições seguras para a retomada das aulas presenciais na cidade de São Paulo? NÃO

Continuamos sob perigo e não sabemos como evitar contatos e aglomerações

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Celso Napolitano

Professor, é presidente da Federação dos Professores do Estado de São Paulo (Fepesp) e diretor do Sindicato de Professores de São Paulo (Sinpro-SP)

Todos os argumentos a favor da volta apressada às aulas presenciais obedecem a interesses políticos e financeiros. Na verdade, as escolas estão ansiosas por garantir rematrículas, e os prefeitos estão de olho nas eleições. Um e outro, com pretensas razões pedagógicas e emocionais, procuram escamotear a questão mais importante —a única questão, em se tratando desta pandemia de um vírus letal e contra o qual ainda não há cura ou vacina—, que é a saúde, a preservação da vida.

Não serão políticos, burocratas ou empresários que poderão decidir ou decretar o retorno às escolas em segurança, mas cientistas, especialistas em saúde pública. Até agora não há sequer um epidemiologista respeitável que garanta com confiável margem de certeza que o convívio de crianças, jovens e adultos no ambiente escolar não causará uma nova onda de contaminação.

Os argumentos que contrapõem a abertura de lojas, academias e salões de beleza ao fechamento das escolas foram fragorosamente derrotados pelo reconhecido e respeitável biólogo Atila Iamarino, que em artigo recente declarou que “escola fechada é sinal de que o resto não deveria estar aberto”.

Um fato é incontestável: ainda não estamos fora de perigo. Longe disso, infelizmente. Não bastam termômetros digitais, tapetes sanitários nas portas das escolas, totens de álcool em gel ou máscaras trocadas a cada duas horas. O risco maior reside no contato pessoal entre os colegas e nas aglomerações nos pátios. Para minimizar esses fatores, imaginou-se impor um rodízio de alunos, com a redução do número de estudantes a 20% do total. Ora, é aí que cai por terra o argumento da necessidade premente do retorno às aulas presenciais.

Não que se negue a importância da socialização e do convívio com a diversidade proporcionada pelo ambiente escolar. Não há educador ou educadora capaz de desprezar a interação pessoal na relação ensino-aprendizagem, mas, em novembro, com menos de dois meses de atividades letivas, a logística do rodízio sanitário acarretará que cada grupo de alunos frequente a escola apenas uma vez por semana, ou seja, sete “sessões presenciais” até o final do ano letivo. Nos dias restantes, os estudantes permaneceriam nas suas residências em estudo remoto.

O que deve ser discutido com seriedade é em que medida tais “aperitivos didáticos” contribuem para diminuir o “impacto na renda futura” e mitigar os “problemas psíquicos de crianças confinadas”, conforme escreveu um conhecido economista e empresário tentando defender o indefensável.

Educadoras e educadores estarão expostos à contaminação em 100% do tempo, sem medidas sanitárias que os protejam. As escolas privadas, predominantemente as de alto custo, pensaram apenas (e precariamente) em medidas midiáticas para, supostamente, tranquilizar as famílias. Em audiência recente no Ministério Público do Trabalho de São Paulo, o procurador Daniel Augusto Gaiotto avaliou como “fracos e bem superficiais” os protocolos de segurança apresentados por representantes dos mantenedores para a proteção de profissionais da educação.

Todos queremos a volta à escola, mas sem açodamento e sem que fatores exógenos induzam a decisão das autoridades —de modo que “todos, professores, alunos funcionários, se sintam seguros e saibam o seu papel para evitar o contágio dentro da escola”, conforme disse Florence Bauer, representante da Unicef no Brasil, em entrevista a esta Folha. Vamos ouvir os especialistas e entender que ninguém pode ser obrigado a se expor à contaminação.

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