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Edmilson de Almeida Barros Júnior

O Supremo deve deixar sob a responsabilidade dos pais a decisão de vacinar seus filhos? NÃO

Ato de não vacinar é negligência extrema e nociva ameaça à saúde pública

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Edmilson de Almeida Barros Júnior

Médico e advogado, é especialista em direito médico e direito da saúde

Sob relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, está nas mãos do Supremo Tribunal Federal decidir de se os pais, por sua exclusiva vontade, podem ou não escolher seguir o calendário de vacinação de seus filhos.

Eventual (e injustificada) resistência pode ser motivada pelos mais variados pretextos, inclusive escusas filosóficas, religiosas, morais, existenciais, de desconfiança —ou até sem motivos. A nosso sentir, a questão é de simples resolução e vai muito além da mera vontade dos “possuidores” do poder familiar. Do ponto de vista jurídico, em diversas passagens da Constituição Federal (tais como artigos 5º, 6º, 196 e 227) existem expressas referências ao direito à saúde (e à vida) dos menores, inclusive como dever da família, da sociedade e do Estado, em benefício de crianças e adolescentes, a serem tratados com absoluta prioridade.

Por sua vez, no âmbito infraconstitucional, o Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) se complementam quanto ao poder dos pais sobre os filhos incapazes (crianças e adolescentes). Para Wilson Oliveira, “o poder familiar é um instituto jurídico destinado a proteger os filhos menores”.

Trata-se de um ​poder-dever atribuído pelo poder público aos pais, visando que os filhos sejam zelados, o que passa necessariamente pela saúde dos mesmos. O desrespeito a esse dever até pode gerar a destituição dos pais desse encargo, já que o objetivo é sempre o bem-estar do menor.

O ECA considera criança os menores até 12 anos incompletos; entre 12 e 18 anos são chamados adolescentes. Na mesma norma, existe a expressa determinação do artigo 14, parágrafo 1º, de que a vacinação é obrigatória em casos recomendados pelas autoridades sanitárias.

O Programa Nacional de Imunização (PNI) foi criado em 1973 e é um dos mais completos do mundo. No calendário de vacinação, na sua imensa maioria, a previsão vacinal ocorre até a maioridade, e todas as vacinas são previamente testadas e aprovadas; portanto, bastante seguras e eficazes. Todas as doenças prevenidas pelas vacinas, se não forem alvo de ações prioritárias, podem voltar a se tornar cíclicas e a atingir grande número de pessoas —menores e adultos.

O ato de não vacinar, além de um risco ao negligenciado, representa uma ameaça extremamente nociva à saúde pública de todos, já que pais que optam por esse caminho estão pondo uma infundada vontade individual por sobre o coletivo e por sobre o interesse público, sem falar no prejuízo ao menor não vacinado, desconsiderando a consequência desse ato no nível macrossocial, já que estão expondo toda a sociedade a doenças de fácil prevenção.

Uma vez os pais decidam não vacinar um filho, e se acaso a criança vier a falecer, exatamente em virtude de uma dessas doenças cobertas pela vacinação obrigatória, gratuitamente fornecida e ministrada na rede pública de saúde, isso é passível de ser caracterizado como homicídio culposo —modalidade negligência ou até mesmo homicídio doloso (dolo eventual), já que os pais, conscientemente, assumiram o risco de levar o menor à morte pela sua opção deliberada de não vacinar.

Ser vacinado é um direito inalienável e indisponível da criança e do adolescente. É dever do Estado, e isso deve se sobrepor a qualquer vontade individual dos pais, desejo esse que talvez nem fosse o mesmo do menor, se acaso ele conscientemente pudesse dar o seu próprio consentimento informado e esclarecido.

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