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Daniel Zovatto

STF, um protagonismo em defesa da democracia

Sob comando de Dias Toffoli, corte reagiu a ataques com firmeza e inteligência

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Daniel Zovatto

Diretor regional para a América Latina e Caribe do Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral (Idea), organismo intergovernamental com sede em Estocolmo (Suécia)

Como atento observador dos processos democráticos e eleitorais na América Latina, acompanhei de perto a profunda mudança política no Brasil determinada pelas eleições de 2018 e as turbulências institucionais que se seguiram desde então.

O processo de rápidas transformações no cenário político coincidiu com o mandato do ministro José Antonio Dias Toffoli na presidência do Supremo Tribunal Federal, que se encerra nesta quinta-feira (10). Esse período teve na Suprema Corte a prova de que as instituições democráticas brasileiras são mesmo sólidas —e em Dias Toffoli uma liderança madura e atenta aos perigos enfrentados pelas democracias contemporâneas em muitos países importantes, nos quais a aliança entre o populismo e a desinformação põem em xeque as próprias instituições.

Daniel Zovatto, diretor regional para a América Latina e Caribe do Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral (Idea)
Daniel Zovatto, diretor regional para a América Latina e Caribe do Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral (Idea) - Eduardo Anizelli - 14.mar.18/Folhapress

No Brasil, esse processo levou a momentos nos quais as instituições democráticas brasileiras foram abertamente atacadas e ameaçadas por setores saudosos de experiências autoritárias do passado. O STF foi alvo prioritário, mas soube reagir com inteligência e firmeza para demonstrar sua autoridade, em defesa da Constituição de 1988.

O protagonismo do Supremo na vida brasileira é um fenômeno que atravessou toda a década passada, marcada pelo combate à corrupção no país, e que se mantém. Não por vontade da corte, mas porque o Brasil o requer, porque a atual dificuldade para construir consensos na sociedade leva muitos dos impasses para o Judiciário. O papel da corte é central para manter a plena vigência do Estado de Direito e dos “checks and balances” entre os Poderes, que são a essência da vida democrática. Em momentos de polarização política como a vivida pelo Brasil nos últimos anos, exercer esse papel é ainda mais difícil: a simples observância das garantias constitucionais e, entre elas, a do direito à ampla defesa, motivou uma intensa campanha de desgaste contra o STF.

Quando ataques ao Judiciário e ao Legislativo ocorrem, a democracia enfrenta riscos; e os perigos no Brasil cresceram, orquestrados nas redes sociais e nas manifestações públicas de setores extremistas e minoritários, como os que pediram o fechamento do Congresso e do STF.

O conhecido perfil conciliador do presidente da corte, marcado pela abertura ao diálogo e pela prudência, foi a principal, mas não a única dimensão da atuação de Dias Toffoli. Sempre que percebeu os riscos de orquestrações antidemocráticas, agiu de modo firme e decidido em defesa do STF e da Constituição, com apoio do colegiado. Toffoli foi, aliás, o primeiro a perceber essas ameaças, no início do mandato, quando abriu um inquérito sobre fake news e ameaças ao Supremo —e foi muito criticado por isso. O tempo mostrou a necessidade da medida, diante do sistemático ataque que se seguiu, e que incluiu ameaças terroristas na chamada “deep web”. A legalidade e constitucionalidade do inquérito foram confirmadas neste ano por ampla maioria do plenário: 10 votos a 1. E a resposta firme a essas manifestações sectárias e seus financiadores foi decisiva para conter os ataques à democracia a partir de junho deste ano.

As fake news e as ameaças às instituições democráticas não se restringem ao caso brasileiro. Por essa razão, a resposta eficaz da corte brasileira a esses perigos foi seguida com grande atenção no plano internacional: ela oferece um bom exemplo e um caminho a seguir por outros países.

A opção do ministro Dias Toffoli pelo diálogo constante com os outros Poderes e com a sociedade, criticada por algumas visões mais ortodoxas, foi a mais adequada para o momento de polarização da democracia brasileira. E foi coerente com o discurso de posse, no qual defendeu a necessidade permanente da construção de pontes na sociedade contemporânea. As pontes ficam como legado, mas as ameaças às instituições democráticas também permanecem e devem continuar a ser enfrentadas, com a mesma clareza e determinação que Toffoli dedicou a esses desafios nos seus dois anos à frente do Supremo Tribunal Federal.

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