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A hora da 2ª instância

Trapalhada com traficante ao menos reacendeu debate sobre cumprimento de penas

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O narcotraficante André Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap - Divulgação

A barafunda em torno da desastrada soltura de um líder de quadrilha pelo ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, teve ao menos o mérito de iluminar algumas das principais disfuncionalidades de nossa Justiça.

Salta à vista, em especial, que um perigoso traficante já condenado duas vezes em segunda instância a penas que somam mais de 25 anos de reclusão —nesta semana, a terceira, o Superior Tribunal de Justiça, confirmou o acórdão em um dos processos— encontrava-se preso devido a uma cautelar.

Estivesse o réu cumprindo sua pena, em vez de retido por prisão preventiva, não teria sido tão fácil ter sido libertado e evadir-se.

O remédio para essa situação é conhecido e defendido por esta Folha —encontrar uma forma de restaurar a prisão após a decisão da segunda instância. Há várias possibilidades no tabuleiro.

A maioria dos integrantes do STF poderia, mais uma vez, mudar de ideia e alterar a jurisprudência. O vaivém da corte, porém, não constitui a melhor resposta ao problema.

O ideal seria que o Congresso Nacional se pronunciasse sobre a matéria. Entre as alternativas está aprovar uma emenda que altere o artigo 5º da Constituição, mas a medida é polêmica: alguns juristas entendem que o texto, por tratar de garantias individuais, estaria blindado contra mudanças.

Outro caminho é a chamada emenda Cezar Peluso (ex-ministro do STF), que deixa intacto o artigo 5º e modifica o sistema recursal. Com isso, o trânsito em julgado se daria após a segunda instância; o acesso a cortes superiores seguiria como hoje, mas não contaria como continuação do processo.

De toda maneira, o cumprimento da pena após a segunda instância colocaria o Brasil em linha com a prática da esmagadora maioria das democracias ocidentais —e teria o efeito adicional de reduzir a proporção de presos provisórios no país, que anda em torno dos 40%.

Este último aspecto levou o Congresso a aprovar, no ano passado, uma norma que obriga as autoridades a renovarem, a cada 90 dias, a fundamentação da prisão provisória. Foi esse o dispositivo usado por Marco Aurélio para soltar o traficante André do Rap.

O objetivo da regra é dos mais nobres. Detentos pobres e sem acesso a bons advogados são frequentemente esquecidos por anos no sistema carcerário, sem julgamento. No episódio recente, faltou bom senso em sua aplicação.

Não por acaso, o Supremo já formou nesta quarta-feira (14) maioria para manter a prisão preventiva do criminoso, agora foragido.

Outro vício escancarado na novela é que os ministros da corte funcionam como 11 ilhas, que não hesitam em usar seus amplos poderes mesmo contra o entendimento do colegiado. Essa questão, por envolver prerrogativas e vaidades, é bem mais difícil de resolver.

editoriais@grupofolha.com.br

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