Descrição de chapéu

Dandara vive em cada mulher negra que age para converter sonho em realidade

Meus votos são para que seus esforços frutifiquem numa onda crescente de justiça e de inclusão

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Ana Cristina Rosa

Jornalista com especialização em comunicação pública, é assessora-chefe de comunicação do Conselho da Justiça Federal (CJF) e colunista da Folha

​É deplorável que direitos reivindicados há séculos sigam sendo negados aos negros e às negras no país. A ausência de solução para causas que remontam há 326 anos, quando uma mulher guerreira de nome Dandara lutou de maneira incansável pelo direito de pretos e pardos à liberdade e reparação, é uma vergonha nacional.

Sobre Dandara pouco se sabe além de seu perfil aguerrido, sustentado até o último suspiro, quando preferiu a morte a subjugar-se à humilhação da escravidão. Em 2019, foi aclamada como Heroína da Pátria (Lei 13.816), embora não se tenha comprovação histórica de sua existência –o que pouco importa e não chega a surpreender diante da verdadeira ocultação da história dos negros no Brasil.

Fato é que Dandara é um estado de espírito. Dandara é sonho, atitude, um conceito que serve de inspiração para lutar o bom combate e agir para concretizar ideais de igualdade e liberdade que se fazem cada vez mais urgentes frente aos inúmeros exemplos de usurpação relacionados a direitos dos negros em geral e das mulheres negras em particular.

Recentemente, levantamento realizado pela consultoria Indique uma Preta e pela empresa de pesquisa Box1824 –intitulada “Potências (In)visíveis: a realidade da mulher negra no mercado de trabalho”– escancarou em números o que já era, senão sabido, ao menos intuído: mulheres negras enfrentam as piores condições de emprego.

Apesar de a maioria da população brasileira ser composta por mulheres negras (28% segundo dados da Pnad 2019 considerando o recorte de gênero e de raça), menos da metade delas exerce atividade profissional remunerada. Para completar, elas recebem menos da metade (cerca de 44%) do salário pago a homens brancos.

Já é passada a hora de dar um basta à naturalização do que, na verdade, é inaceitável. Afinal, inclusão não é favor. Inclusão é direito.

Os traços de Dandara podem ser facilmente reconhecidos em cada mulher negra que acredita no poder transformador dos sonhos e age para que eles se convertam em realidade.

Quando uma negra propõe um debate que resulta em ação capaz de ampliar a participação de pretos e pardos na cena política, democratizando o acesso a postos de comando em instâncias de poder e decisão, ela é Dandara.

Quando idealiza e realiza no Brasil o maior evento de cultura negra da América Latina, valorizando o empreendedorismo de afrodescendentes e contribuindo para que tenhamos uma sociedade menos excludente, esta mulher é Dandara.

Quando cria uma instituição a fim de reduzir a desigualdade racial no preconceituoso mercado de trabalho brasileiro, que ostenta a desoladora marca de 13,8 milhões de pessoas desempregadas, Dandara vive.

Quando se torna a primeira mulher negra a assumir a posição de CEO numa subsidiária de multinacional e eleva a organização da 26ª para a 3ª posição no ranking dos maiores mercados da companhia, ela representa Dandara.

Quando negras se articulam e formam um grupo para que concorram juntas a um cargo eletivo por meio de candidatura coletiva, elas são Dandara.

Existem muitas mulheres negras que contribuem de maneira incansável, como guerreiras contemporâneas em busca de um estágio social mais igualitário. É uma luta ainda injusta e desigual, porém absolutamente necessária e urgente.

Neste novembro, mês da Consciência Negra, meus votos são por um Brasil onde as Dandaras de hoje se multipliquem e seus esforços frutifiquem numa onda crescente de justiça e de inclusão. Dandara está entre nós. E sua busca por igualdade, liberdade e inclusão se faz cada vez mais viva em cada mulher negra.​

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