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África

Etiópia à beira do caos

País vive ameaça de guerra civil apenas um ano após premiê receber Nobel da Paz

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Forças governistas retornam à base após combate na região de Tigré, na Etiópia - Tiksa Negeri/Reuters

O possível início de uma guerra civil na Etiópia é fato de consequências potencialmente catastróficas para a África, com ingredientes que o tornam especialmente perigoso.

Segundo país mais populoso e sétima maior economia do continente, a Etiópia sempre projetou influência para muito além de suas fronteiras. É a potência indiscutível da volátil região do Chifre da África e tem tradição pan-africanista, sediando a União Africana.

O conflito tem como pano de fundo tensões entre o governo central e a região de Tigré, no norte. Como ocorre com frequência no continente, o componente étnico é preponderante.

Sentindo-se alijados das decisões nacionais, os tigrínios, que comandaram politicamente o país entre 1991 e 2012, decidiram ignorar a ordem do governo de postergar a eleição para o Parlamento regional e seguiram em frente, o que foi visto como uma provocação.

A escalada militar não demorou, e as Nações Unidas já alertam para uma crise humanitária.

O adiamento do pleito havia sido determinado em razão do coronavírus —e por isso o conflito etíope já vem sendo chamado de primeira guerra da Covid-19.

O embate ameaça anular os ganhos da Etiópia em um raro período de estabilidade de sua turbulenta história —que incluiu, no último século, uma monarquia absolutista e uma ditadura comunista.

Nos últimos 15 anos, a economia do país cresceu a taxas anuais próximas de 10%, com políticas inovadoras em agricultura e maciços investimentos, sobretudo chineses. A taxa de pobreza caiu de 45% para menos de 30% da população.

Nada simboliza melhor esse renascimento do que a construção de uma gigantesca represa no rio Nilo, atualmente em fase final, que foi pensada para alimentar décadas de expansão econômica futura.

Sem estabilidade política, o investimento terá sido apenas mais um exemplo de desperdício de recursos públicos e falta de planejamento num continente acostumado a elefantes brancos.

Uma guerra civil pode gerar ondas de refugiados que desestabilizariam os já frágeis vizinhos do país. Há afinidades étnicas em jogo que ultrapassam fronteiras.

Numa ironia final, um dos protagonistas da atual crise, o premiê etíope, Abiy Ahmed, ganhou o Nobel da Paz por contribuir para ao fim de um conflito com a Eritreia, há apenas um ano. Agora, no entanto, preferiu as bombas ao diálogo.

editoriais@grupofolha.com.br

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