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Facultativo, na prática

Norma obsoleta do voto obrigatório é esvaziada com aprendizado dos eleitores

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Urna eletrônica utilizada na eleição de 2020 - ISAAC FONTANA / FramePhoto / AG

O processo é paulatino, mas os brasileiros parecem se dar conta de que, embora o voto seja formalmente obrigatório para a maioria dos cidadãos, a possibilidade de abstenção sem maiores consequências o torna facultativo na prática.

Assim o indica a série histórica. Nas eleições municipais de 2000, 16,2% dos eleitores não foram votar. Essa proporção seguiu tendência de alta gradual, pleito a pleito, e atingiu, agora, a marca de 29,6%. Ainda que se considere este 2020 um ano atípico, em razão da pandemia de Covid-19, já em 2016 a taxa chegava a expressivos 21,6%.

Dito de outra maneira, os percentuais de comparecimento não ficam muito acima dos observados em países onde o voto é facultativo.

No papel, as sanções para quem não comparece à urna nem justificar a ausência são duras. Incluem não poder participar de licitações e concursos públicos, matricular-se em estabelecimentos de ensino oficiais e tirar passaporte. Caso o abstinente seja servidor público, fica sem receber seus vencimentos.

Na vida real, entretanto, é raro que se chegue a tais extremos. O eleitor tem prazo de 60 dias para justificar a ausência; na falta de um motivo convincente, precisa pagar uma multa —mas seu valor é irrisório, não excedendo R$ 4.

Até alguns anos atrás, o incômodo de enfrentar a burocracia entre cartórios e bancos ainda funcionava como bom incentivo ao voto. Mas, com a informatização, a tarefa se torna cada vez mais simples.

A depender da distância que o cidadão precisa percorrer para votar e do meio de transporte que utiliza, pode ser mais fácil e barato pagar a multa do que visitar a urna.

Deixar que cada eleitor decida se exercerá ou não o direito ao voto não é um problema. Esta Folha defende há tempos que o voto deixe de ser obrigatório, como ocorre na esmagadora maioria das democracias. O esvaziamento da norma brasileira reflete sua obsolescência.

Para políticos e partidos, já não basta conquistar a preferência dos eleitores —é preciso também motivá-los a sair de casa e ir à urna. O trabalho dos institutos de pesquisa também fica mais difícil.

O fato é que não devemos mais esperar comparecimento elevado em todos os pleitos, em especial nos municipais. Os índices tendem a subir ou cair conforme as disputas sejam percebidas como mais ou menos decisivas pelo público. Essas variações fazem parte da democracia e em nada diminuem a legitimidade dos eleitos.

editoriais@grupofolha.com.br

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