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Leonardo de Andrade Rezende Alvim e Larissa Luzia Longo

A taxação de grandes fortunas é uma medida fundamental na reforma tributária? NÃO

Arrecadação é baixa e cria-se complexidade ainda maior no sistema tributário

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Leonardo de Andrade Rezende Alvim e Larissa Luzia Longo

Pesquisadores do Núcleo de Tributação do Insper

É fundamental que se discuta justiça fiscal e progressividade, mas a experiência com o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) nos países que o adotaram não indica que essa é a melhor solução. Sua arrecadação é baixa e aumenta-se a complexidade do sistema tributário. No caso do Brasil, constata-se, ainda, que a maioria dos projetos para a instituição do IGF é muito distante da sofisticação daqueles que foram adotados em outros países.

Considerando-se dados de arrecadação de países que ainda cobram tributo similar ao IGF, o percentual da arrecadação em relação aos demais tributos é baixo. Segundo dados da OCDE, em 2019, na Noruega, era de 1,1%; na Espanha, de 0,5%; e, na França, de 0,2% do total da arrecadação. É na Suíça que sua arrecadação é mais representativa, com 3,8%.

A criação de um novo tributo aumenta a complexidade do sistema tributário, impondo novas obrigações acessórias e mais contencioso, algo indesejável para um país que ocupa a 184ª posição no indicador de pagamento de impostos do Doing Business e que possuía um contencioso tributário de R$ 5,4 trilhões (75% do PIB) em 2019, conforme pesquisa do Núcleo de Tributação do Insper.

Além disso, projetos em andamento no Congresso que pretendem instituir o IGF precisam de maior debate e aprofundamento: levantamento do Insper demonstra a enorme disparidade quanto ao conceito de grande fortuna, alíquotas e destinação de receitas. Há projeto que chama de grande fortuna um patrimônio de R$ 2,2 milhões, enquanto outro começa por R$ 10 bilhões. A pesquisa, de abril de 2020, analisou 37 projetos, sendo que em 26 deles sequer havia previsão de arrecadação.
Os impactos econômicos também precisam ser estudados. Ao contrário de outros países, praticamente não há literatura sobre o assunto no Brasil, o que potencializa riscos. Riscos que podem ser ainda mais prejudiciais considerando o cenário socioeconômico decorrente da pandemia de Covid-19.

No nível federal, reformas no Imposto de Renda (IR) podem melhorar as desigualdades na tributação sem as mazelas e incertezas do IGF. A revisão do regime do lucro presumido deveria considerar que não pode haver dupla não tributação —o mesmo com o Simples Nacional. O lucro que não sofreu incidência de IR na pessoa jurídica deveria ser tributado ao ser distribuído para a pessoa física. O tipo de atividade econômica que gera o lucro também não deveria fazer diferença, já que a pessoa jurídica é uma ficção e, portanto, o que se está tributando são os sócios.

Por que sócios de um empreendimento imobiliário ou de um banco devem ser tributados de formas diferentes, quando ambas podem receber os mesmos valores? A tributação dos rendimentos acumulados pelas carteiras de fundos de investimento constituídos sob a forma de condomínio fechado também poderia ser revista, evitando um diferimento longo ou eterno.

Se o que queremos é tributar as pessoas com mais, ainda que seja apenas o 0,1% mais rico, talvez apostar no IGF não seja a melhor alternativa. Há muitas falhas no sistema de tributação da renda, cuja construção olhou mais para a simplicidade e muito pouco, ou nada, para a neutralidade e a justiça fiscal. E o país não pode mais perder tempo.

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