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Patrícia Zampol

Decisão infeliz

Aplicar IPCA para atualizar dívidas trabalhistas emperra retomada econômica

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Patrícia Zampol

Advogada, é sócia de Edgard Leite Advogados Associados

O Supremo Tribunal Federal (STF) deu a sua contribuição para transformar em utopia a busca das empresas e do país por equilíbrio financeiro, além de dificultar a geração de empregos e o reaquecimento da economia brasileira.

Trata-se de princípios essenciais para o desenvolvimento de qualquer nação. Ao que parece, no caso das correções de dívidas trabalhistas, a Suprema Corte estreitou sua visão de mundo e do próprio país.
Não bastassem as inúmeras obrigações legais do empregador, recentemente o Ministério Público do Trabalho emitiu uma nota técnica (GT 20/2020) em que caracteriza a Covid-19 como enfermidade passível de equiparação à doença profissional. A consequência objetiva dessa nota é que o colaborador que tenha contraído a doença possa buscar na Justiça pagamento de indenizações e reconhecimento de estabilidade. Mas como provar que o empregado contraiu a doença no ambiente de labor ou no supermercado e no bar, com os colegas de jornada, após o expediente?

O aperto sobre as empresas, contudo, ocorreu mesmo no derradeiro dia de expediente do Judiciário, em 2020, quando o STF julgou as Ações Declaratórias de Constitucionalidade e decidiu, por 6 votos a 4, que a correção monetária de débitos trabalhistas deverá ser o IPCA e não a Taxa Referencial (TR).

Até agosto de 2019, a única forma de correção do saldo devedor de um contrato era a TR, que não é um índice, mas uma taxa cujo cálculo é utilizado na correção de certas operações. Em 2015, quando a inflação chegou aos 10% ao ano, a TR permaneceu em uma média de 2%.
Bancos que trabalham com financiamentos oferecem contratos com correção pela TR. A Caixa

Econômica Federal utiliza as taxas de juros médias de até 8,5% para essa modalidade. Nessa mesma época, a Caixa lançou a modalidade de financiamentos com saldo devedores corrigidos pelo IPCA. Sabe-se que, mesmo quando o IPCA está muito baixo (cerca de 3%), ainda assim é uma taxa elevada quando se trata de corrigir saldo devedor de caráter trabalhista.

Dados apresentados pelo ministro do Supremo Luís Roberto Barroso apontaram que “o Brasil, sozinho, é responsável por 98% das ações trabalhistas de todo o mundo, enquanto o país possui 2,7% da população da Terra”. Citou, ainda, que “o Citibank, que encerrou suas operações de varejo no Brasil, obtinha 1% de suas receitas no país, enquanto 93% de suas reclamações trabalhistas em nível mundial concentravam-se aqui”.

Além disso, desconsiderar trecho da reforma trabalhista de 2017, que previa a correção dos débitos trabalhistas pela TR, é lançar novas bases para aumentar o volume de reclamações judiciais. Pode-se até dizer que essa mudança de indexador torna o ajuizamento de processos trabalhistas um dos melhores “investimentos” do país.

Aplicar os índices IPCA e Selic aos débitos trabalhistas encarecerá por demais a dívida no momento da atualização. Fixar o IPCA para correção é apostar que a inflação se manterá sempre baixa. Não é isso, porém, o que tem mostrado a realidade.

A referência TR representa uma escolha mais equânime, que admite variações —porém nada exacerbadas, como a oscilação da inflação.

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