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José Luis Oliveira Lima

Tribunal Penal Internacional trai as esperanças de seus fundadores

Corte não tem legitimidade para tratar do conflito israelo-palestino

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José Luis Oliveira Lima

Advogado criminalista, é membro do Instituto dos Advogados (Iasp) e do Conselho Fiscal do Inoccence Project

O Tribunal Penal Internacional (TPI) surgiu como uma resposta à conduta de nações que, sistematicamente, cometem atrocidades contra suas próprias populações, dizimando minorias e tolhendo direitos de seus cidadãos.

No entanto, passadas duas décadas de sua criação, o TPI parece longe de cumprir seu objetivo. Conseguiu garantir apenas quatro condenações e atualmente enfrenta uma grave crise de legitimidade.

Constou de um recente relatório, elaborado por um órgão de revisão de peritos independentes, a existência de uma série de deficiências no funcionamento da corte, incluindo um relaxamento preocupante no atendimento às precondições para a intervenção do tribunal.

Sede do Tribunal Penal Internacional, em Haia, na Holanda - Piroschka van de Wouw - 16.jan.19/Reuters

Foi justamente por conta da inobservância dos requisitos necessários para a atuação do TPI que sua Câmara de Pré-Julgamento cometeu recentemente um grave equívoco: reconheceu sua jurisdição em relação a questões envolvendo o conflito israelo-palestino, o que extrapola em muito sua legitimidade como órgão judicial.

De início, registra-se que a câmara se recusou a analisar a existência, do ponto de vista jurídico formal, de um Estado palestino capaz de delegar jurisdição ao Tribunal Penal Internacional. Isso porque, de acordo com o Estatuto de Roma —que rege o funcionamento do tribunal—, a corte só poderá atuar no território de Estados-membros, o que não é o caso do Estado palestino. Seu status de “Estado observador”, concedido pela ONU, possui natureza política e não jurídica. Se a jurisdição do Tribunal Penal Internacional deve, obrigatoriamente, observar o direito internacional, então o esclarecimento a respeito da definição jurídica do que seria o Estado palestino é matéria que deve anteceder o debate envolvendo a atuação da corte no conflito.

Ademais, ainda que tal questão pudesse ser superada com facilidade, o tribunal deveria recordar-se de que sua atuação está restrita à ocorrência de quatro espécies de crimes (genocídio, definido como a tentativa de aniquilar determinado grupo étnico, racial ou religioso; crimes contra a humanidade, os quais se traduzem em ataques deliberados à população civil, através de assassinatos, estupros e condutas afins; crimes de guerra, os quais ocorrem em situações que desrespeitem a Convenção de Genebra; e crimes de agressão, que se dão a partir da utilização das Forças Armadas para atingir a soberania de outro Estado).

Não parece que o conflito israelo-palestino se enquadre em qualquer das hipóteses acima elencadas. Traçar um paralelo entre o que ocorre na região com a prática de crimes contra a humanidade é um posicionamento político, não jurídico. E, como ocorre em qualquer tribunal legítimo, não se pode admitir que a política se sobreponha à Justiça e ao devido processo legal.

O conflito israelo-palestino é um dos grandes dramas do último século. Mas forçar a atuação do Tribunal Penal Internacional, ignorando sua patente ausência de legitimidade, parece trazer mais problemas do que soluções, tanto para a região quanto para a própria corte.

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