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Ideologia mortal

Cultura pró-armas dos EUA, que inspira o bolsonarismo, desafia a racionalidade

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Loja de armas em Delray Beach, na Flórida - Joe Raedle/AFP

A cada novo massacre a tiros nos Estados Unidos —e contam-se nada menos que 121 com quatro vítimas ou mais desde 1982— renovam-se as discussões acerca do controle de armas de fogo no país, cuja legislação acerca do tema é uma das mais permissivas do mundo.

Em 16 de março, um homem assassinou 8 pessoas, 6 delas de origem asiática, na cidade de Atlanta. Dias depois, um atirador abriu fogo num supermercado em Boulder, no Colorado, matando outras dez.

As preocupações atuais vêm estribadas também no crescimento das mortes por armas de fogo em assaltos e brigas domésticas. No ano passado, registraram-se quase 20 mil óbitos por tiros nos EUA, um salto considerável em relação à média de 15 mil óbitos desde 2016.

Embora aponte-se a concorrência de fatores associados a pandemia nos casos específicos desses últimos crimes, estudos mostram que o acesso praticamente irrestrito a pistolas, fuzis e rifles, somado a uma cultura que enaltece sua posse, constitui o agente estrutural por trás do fenômeno.

Foi isso que permitiu que os Estados Unidos se tornassem, de longe, a nação com o maior número de armas per capita do mundo. Em 2018, o país abrigava 393 milhões delas para 326 milhões de habitantes —nada menos que 45% do total em circulação no planeta.

Não obstante a evidente necessidade de cercear tal comércio, pouco ou nada se avançou nas últimas décadas nesse sentido. As resistências ancoram-se numa emenda à Constituição do fim do século 18, que consagra o direito de possuir e portar armas de fogo. Passados mais de 200 anos, seus defensores se valem do argumento de que os cidadãos devem ser capazes de se proteger da criminalidade.

Além disso, sempre que o Congresso ensaia endurecer as regras, o poderoso lobby do setor atua para barrar as iniciativas. Deverá ser esse o destino, por exemplo, de duas propostas modestas aprovadas há pouco na Câmara (ampliação da checagem de antecedentes de compradores e aumento do prazo entre a venda e a entrega), mas que ainda precisam passar pelo Senado.

Mesmo alterações que poderiam ser feitas sem precisar do beneplácito do Congresso são consideradas de difícil execução, dados os altos custos políticos envolvidos.

Tal ideologia armamentista, assumida por aqui como agenda do governo Jair Bolsonaro, não encontra respaldo na racionalidade que deve guiar as políticas públicas.

editoriais@grupofolha.com.br

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