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Arthur Lira

Onde estamos, para onde vamos

Democracia será lembrada como o esteio que nos sustentou nesta agonia

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Arthur Lira

Presidente da Câmara dos Deputados (PP-AL)

Ao completar os primeiros cem dias como presidente da Câmara dos Deputados, quero compartilhar um pouco das percepções de como enxergo o país e a nossa dinâmica social e política. E tomo essa iniciativa após um momento que é um marco de nossa democracia, cuja aprovação tive a honra de presidir: a Lei do Estado Democrático de Direito, uma resposta cidadã e democrática ao entulho autoritário que antes ocupava o seu lugar, a Lei de Segurança Nacional. Muito já se falou sobre a simbologia e sobre os avanços da nova lei. Prefiro aqui olhar o contexto atual de forma mais ampla e em perspectiva, tendo esse esplendoroso avanço institucional como ponto de partida.

Não tenho a presunção de oferecer uma visão superior ou mais aprofundada do que qualquer um pode ter, seja qual for o seu olhar para a realidade. Muito menos quero enveredar pelas trilhas perigosas das controvérsias e dos bordões dos extremos. Quero oferecer, a partir de um ângulo em que poucos podem observar os acontecimentos, a minha contribuição pessoal e despretensiosa para a questão que aflige a todos: onde estamos e para onde vamos?

Hoje, tenho uma noção muito mais clara e, para ser franco, muito mais acurada e otimista sobre o estado de nossas instituições. Essa expressão, que para tantos parece tão vaga, mas que no exercício de uma função pública destacada se mostra em toda a sua inteireza —a democracia—, exibe todo o seu vigor e toda a sua vitalidade.

Desde que assumi o posto de presidente da Câmara dos Deputados pude acompanhar de perto e de dentro algumas placas tectônicas de nossa democracia se moverem e a reverberação de seus estrondos institucionais. Mas esses movimentos só reforçaram em mim a convicção de que a democracia no Brasil não é um tigre de papel. É uma construção sólida, enraizada e madura, capaz de absorver suas próprias contradições e sair mais forte a cada teste.

É neste ponto onde estamos: numa sociedade de alto padrão democrático. Uma sociedade que padece, sim, um de seus piores momentos, juntamente com o mundo, diante do terror e do temor causado por uma pandemia sem precedentes, com impactos dilacerantes na vida de centenas de milhares de irmãos e irmãs, de famílias, com o luto que ronda quase todas as esquinas, a insegurança em relação ao amanhã, o desespero daqueles que precisam de amparo para garantir a sobrevivência, com a economia profundamente abalada e com o modo de vida de todos afetado como nunca antes.

Mas enfrentamos todas essas diversidades com o legado sagrado de uma democracia que, apesar de todos os nossos problemas presentes e futuros, nos oferece a base que nunca pode faltar a nenhuma sociedade: a esperança em dias melhores.

Tem sido doloroso, sim, o nosso caminhar nesses dias. Mas, no futuro, também será notável observar —para muito além das paixões que cegam os contemporâneos de cada tempo— como as instituições do país conseguiram atravessar essas horas tão incertas e as respostas que deram nessa travessia.

Muitos erros aconteceram, mas muitas grandes e importantes definições foram feitas também nessas horas de tão enorme agonia. E a democracia, com todos os seus defeitos, um dia será lembrada como o esteio que nos sustentou como nação nesta quadra, através da coreografia de nossas instituições.

Eu creio que o melhor ainda não começou, mas quero crer que o pior do pior já pode estar ficando para trás. Nos próximos meses, a imunização coletiva através do programa de vacinação avançará inexoravelmente. Em algum momento não muito distante, o coração do sistema econômico pujante de nosso país voltará a bater. Nada, obviamente, trará de volta a vida ou aplacará a angústia e o sofrimento, que ficarão como uma cicatriz em nossa história. Mas a democracia, a nossa democracia, terá passado por um de seus mais duros testes. E se renovará.

É nessa capacidade permanente da democracia de absorver as pressões e se renovar continuamente que reside a semente da esperança. E é para lá que vamos. Temos de cumprir nosso dever agora com o máximo de diligência e noção de responsabilidade histórica. Não podemos nos confundir com as balbúrdias passageiras. Precisamos lembrar, sempre, que tudo passa, mas o Brasil continua. Temos a obrigação de encarar o hoje com todas as suas dificuldades, mas nunca esquecer que haverá um amanhã.

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