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Vacina para o mundo

Por razões morais e pragmáticas, países ricos deveriam doar doses aos pobres

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Vacinação em Hyderabad, na Índia - Str/Xinhua

Vacinas contra a Covid-19 não somente foram desenvolvidas em tempo recorde —menos de um ano desde a declaração da pandemia— como foram produzidas, distribuídas e aplicadas em larga escala.

Apenas seis meses depois de a primeira dose ter sido inoculada em uma pessoa fora de situações experimentais, 1,6 bilhão de doses já foram injetadas em braços humanos. Espera-se que, até o fim deste ano, a indústria farmacêutica produza 11 bilhões de doses, em tese suficientes para imunizar toda a população adulta do planeta.

A história soa menos gloriosa quando analisamos a repartição das vacinas até aqui. Países ricos, que agregam 15% da população mundial, abocanharam quase metade dos imunizantes disponíveis.

Enquanto um terço de seus habitantes recebeu ao menos uma dose, nas nações pobres essa proporção mal chega a 0,2%.

Há aí, como classificou o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, um “fracasso moral catastrófico”. E, mesmo para quem assume a lógica do eu primeiro, pode haver um erro de cálculo.

Afinal, ao deixar grandes populações sem proteção, aumenta-se a probabilidade de surgirem, por seleção natural, variantes mais perigosas do vírus, com potencial de atingir todos os países, inclusive os ricos e avançados na vacinação.

Não é necessário, porém, mais do que um pouco de realismo para perceber que a repartição equitativa dos imunizantes nunca teve a menor chance. O mundo está dividido em países e não se deve esperar que o presidente dos EUA, por exemplo, dê à vacinação dos moçambicanos a mesma prioridade que dá à dos americanos.

Tal constatação, obviamente, não desobriga os líderes dos países ricos de agir moralmente e pensar também no resto do mundo, se esforçando para tornar a distribuição um pouco menos desbalanceada.

No primeiro semestre de 2020, quando ainda não se sabia quais imunizantes seriam aprovados, fazia sentido para um país como o Canadá encomendar o equivalente a dez unidades de vacina por habitante. Hoje, sentar-se em cima desses estoques é injustificável.

É imperativo que as nações ricas agilizem as doações das doses que não irão usar, de preferência para os países mais pobres e/ou sob maior risco epidemiológico. Adicionalmente, deveriam assumir uma posição ainda mais ativa num programa para assegurar a vacinação imediata pelo menos das equipes médicas das nações carentes.

Por qualquer cálculo de custo e benefício, é inaceitável que adolescentes saudáveis de países ricos, cujo risco de agravamento em caso de infecção é muito pequeno, já estejam sendo imunizados, enquanto médicos da linha de frente de regiões pobres ainda não.​

editoriais@grupofolha.com.br

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