Julgamento recente do Supremo Tribunal Federal concluiu ser inconstitucional a regra prevista na Lei de Propriedade Industrial (LPI) que conferia prazo de exclusividade mínimo contado do efetivo registro de uma patente e não na apresentação do pedido de registro de patente ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).
O relator, ministro Dias Toffoli, defendeu que a Constituição exigiria a fixação legal de um prazo certo, inflexível. O dispositivo questionado (o parágrafo único do artigo 40) da lei determinava que o prazo de vigência não seria inferior a dez anos contados do momento em que a patente é registrada, algo incerto. O STF decidiu que a inconstitucionalidade alcança patentes já vigentes para medicamentos e equipamentos de saúde. Perderão a proteção as patentes de medicamentos com mais de 20 anos contados da apresentação ao Inpi.
O prazo estendido, declarado inconstitucional pelo STF, tinha razão de ser. O Inpi tarda um tempo absolutamente incomum para analisar um pedido. Em 2018, por exemplo, o tempo médio de análise de uma patente nos EUA era de dois anos. Já no Inpi, 10,5 anos. O prazo da análise do instituto varia com o ramo de atividade. Em 2018, a divisão mais morosa era a de fármacos, com 13 anos de espera desde o pedido de registro de uma patente até a aprovação do seu registro.
Segundo o relator, ministro Dias Toffoli, na hipótese do Inpi demorar 15 anos para conceder uma patente, pela garantia adicional de dez anos desde a concessão, ao final, o período de proteção terá sido de 25 anos. Pelo entendimento vencedor no Supremo, o prazo ampliado daria vantagem excessiva aos detentores das patentes e impediria a entrada de concorrentes, ensejaria preços elevados em prejuízo aos consumidores e ao sistema de saúde.
A decisão da corte fez um diagnóstico correto, mas apresentou prognose equivocada. Há um problema no tempo que o Inpi leva para fazer o registro de patentes, algo sem paralelo internacional. E há uma pressão por flexibilizar patentes de fármacos num momento de pandemia. São constatações corretas.
Mas acabar com a regra do parágrafo único do artigo 40 é dar o remédio errado ao paciente.
Patentes não podem ser eternas, é fato. Mas também não podem ser incertas e precárias, como decorre da decisão do STF. Entre a apresentação e o registro não se tem propriamente proteção ao inventor. Como lembrou o ministro Luís Roberto Barroso, o que se tem é uma expectativa fragilmente protegida. A exclusividade constitucionalmente garantida só é efetiva após o registro. Como o Inpi não tem prazo para registrar, ao fazer fluir o prazo legal de proteção neste período de baixa proteção, a decisão fragilizou as patentes no Brasil. Foi na contramão do incentivo à ciência, à inovação e à invenção.
A situação pandêmica pode e deve ser enfrentada com soluções efetivas, não com um retrocesso num sistema que existe há décadas e tem dado certo. Os maiores interessados num regime fiável e estável de proteção patentária não são as empresas que as exploram. São os pesquisadores e inventores. É a ciência. No aparente conflito entre as multinacionais farmacêuticas e a indústria nacional de genéricos, perderam as universidades. Perdeu a ciência. Uma pena.
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