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Cultura bolsonarista

Parecer sobre festival dá mais uma mostra do aparelhamento ideológico da pasta

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O secretário da Cultura, Mário Frias - Pedro Ladeira/Folhapress

Embora o governo tenha recentemente se livrado de algumas de suas figuras mais esdrúxulas, como os ex-ministros Ricardo Salles e Ernesto Araújo, os bolsões ideológicos do bolsonarismo mantêm-se ainda vivos e atuantes no topo da administração federal, como se testemunha na área da cultura.

Uma nova amostra de tacanhez da secretaria comandada pelo ator Mario Frias veio a lume nesta semana. Aquilo que deveria constituir uma mera análise técnica e rotineira de um documento converteu-se numa tosca peça de perseguição, pedantismo vazio e descabido apelo religioso.

O alvo foi o Festival de Jazz do Capão, na Chapada Diamantina (BA), que havia entrado com um pedido de captação de recursos por meio da Lei de Incentivo à Cultura, a antiga Rouanet —diploma que, vale lembrar, é alvo das mistificações de Jair Bolsonaro e seus apoiadores mais fiéis desde a campanha.

No tragicômico parecer que negou a demanda, produzido no âmbito da Fundação Nacional das Artes, combinam-se citações de gosto duvidoso, versos em latim e frases como “o objetivo e finalidade maior de toda música não deveria ser nenhum outro além da glória de Deus e a renovação da alma”.

Como se o ridículo fosse pouco, o fato de o evento ter-se declarado “antifascista e pela democracia” no ano passado tornou-se um argumento contrário ao projeto no parecer, que terminou por concluir que ele traria “desvio de objeto, risco à malversação do recurso público incentivado com propositura de indevido uso do mesmo”.

O obscurantismo burocrático foi seguido por tentativas de intimidação. Críticas à condução da política cultural e ao parecer da Funarte feitas nas redes sociais foram respondidas por Frias com ameaças de processos —atitude na qual, aliás, o secretário é reincidente.

Ao menos o Ministério Público Federal se moveu, instaurando um inquérito civil para apurar “violação aos princípios da legalidade, impessoalidade e do Estado laico, bem como desvio de finalidade no indeferimento do projeto”.

Nada, por óbvio, obrigava à aprovação do pedido feito pelo festival de música baiano. Da maneira como foi engendrada, entretanto, sua rejeição é mais um sinal do estado de indigência em que se encontra a gestão cultural do país, submetida a aparelhamento ideológico e incompetência técnica.

editoriais@grupofolha.com.br

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