Descrição de chapéu
O que a Folha pensa

É preciso reagir

Cabe responsabilizar Bolsonaro por palavras, mesmo que importem cada vez menos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O procurador-geral da República, Augusto Aras - Antonio Augusto/Secom/PGR

A palavra e o poder nem sempre estão conectados. Há sociedades menos complexas em que o chefe discursa para o vento. Emposta a voz em ladainhas rotineiras, enquanto as pessoas tocam suas vidas sem dar ouvidos à falação.

As famigeradas “lives” de quinta-feira do presidente Jair Bolsonaro assemelham-se cada vez mais àquelas encenações tribais de vazio de poder. A extensão dos discursos —e o conteúdo delirante das mensagens— corre na contramão da credibilidade e da popularidade do mandatário brasileiro. Quanto mais fala, menos manda.

A comparação, no entanto, tem o seu limite. À diferença do que ocorre em organizações políticas elementares, no Estado democrático de Direito o chefe do governo detém poder e responsabilidade e, por isso, deve prestar contas à sociedade de seus atos e palavras.

Bolsonaro passou mais de duas horas, na noite do último dia 29, a vituperar contra a urna eletrônica. Como se não tivesse nada importante a fazer, em meio ao morticínio de mais de 550 mil brasileiros pelo coronavírus, mobilizou recursos da União para atacar com uma profusão de mentiras o mecanismo responsável há anos pelo sucesso das votações no país.

Que ele alimenta a farsa a fim de encontrar pretexto para a possível derrota no ano que vem parece evidente. Mas isso não anula, da parte das autoridades incumbidas de impor limites ao Bonaparte do Planalto, a necessidade de responsabilizar um presidente da República que dobra a aposta na campanha de sabotagem contra um pilar do regime democrático.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, não tem desculpas para a inação e a protelação. Como outras figuras que se acomodam e se associam à aventura Jair Bolsonaro, cabe-lhe ponderar como seu nome vai figurar na história quando esse período anômalo da política brasileira houver passado.

A mesma reflexão vale para o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Em nome de interesses imediatistas, continuar obstaculizando a análise de dezenas de pedidos de impeachment que enchem suas gavetas pode, ademais, comprometer seu futuro na política, como a intenção de reeleger-se para o comando da Casa em 2023.

Dos deputados federais e líderes partidários, a retomada das atividades legislativas na semana que entra, nesse contexto de arreganhos e ameaças presidenciais, exige foco para fulminar de uma vez por todas a proposta de emenda à Constituição que cria o voto impresso.

Que Jair Bolsonaro, como um chefe impopular e desacreditado, seja deixado falando sozinho, mas que também sinta o vapor das instituições de controle e da maioria democrática no seu encalço.

editoriais@grupofolha.com.br

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.