Descrição de chapéu
Irene Abramovich

O respeito ao paciente não pode morrer na UTI

Permitir videochamadas é um ato de humanidade, mas só com consentimento

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Irene Abramovich

Médica e presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp)

Indiscutivelmente, a tecnologia tem sido importante aliada, durante a pandemia, no encurtamento de distâncias entre as pessoas. No entanto, não podemos nos esquecer que essa mesma tecnologia pode ser considerada invasiva no que diz respeito à intimidade e à vontade individual. É necessário, portanto, que saibamos usá-la com consciência e respeito.

Nesse contexto, o uso de recursos digitais voltados à comunicação entre pacientes e familiares é tema importante para o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), que publicou, recentemente, a resolução n° 347, responsável por regulamentar as videochamadas, não só no contexto da Covid-19, mas de modo geral.

A normativa determina que o assistido pode realizar visitas virtuais —se essa for sua vontade —desde que se respeite a privacidade dos demais e que também pode designar um representante, a quem caberá comunicar ao médico o desejo de ter ou não a imagem transmitida, caso ocorra a perda da capacidade para consentir.

Se, porventura, o paciente não fizer essa escolha, o profissional deverá se valer das diretivas antecipadas de vontade, que devem ser registradas no prontuário previamente à perda de sua capacidade para consentir, para deferir se gostaria ou não de participar de videochamadas. Com isso, é possível saber o real desejo mesmo de pacientes sedados.

A resolução n° 347 defende o princípio bioético da autonomia e preserva o sigilo do médico e do paciente —um dos pilares da relação médico-paciente— conforme defende o Código de Ética Médica, assegurando que o uso do digital seja feito de forma ética e respeitosa, sem que haja prejuízo à equipe profissional e aos demais assistidos que não desejam ter sua imagem divulgada.

O documento busca viabilizar esse recurso de modo que os direitos fundamentais do paciente sejam preservados, em especial a autonomia, a privacidade e o sigilo. Portanto, não se trata de proibição às videochamadas. Permitir seu uso é um ato de dignidade e humanidade, mas apenas se o paciente consentir.

Sempre deve prevalecer a vontade dele, incluindo o respeito à privacidade, dignidade e sigilo, que orientam uma medicina digna e humana. Há que se levar em conta ainda o respeito ao sigilo dos demais pacientes, internados no mesmo ambiente de UTI.

Cabe reforçar que a normativa refere-se, substancialmente, à conduta médica, uma vez que há a delegação constitucional do poder público, por meio da lei n° 3.268/57, que, em seu artigo 15°, determina que é atribuição dos conselhos regionais de medicina fiscalizar o exercício da profissão.

Recentemente, foi aprovado pela Câmara dos Deputados o projeto de lei n° 2136/20 —agora em análise pelo Senado Federal—, que vai ao encontro da resolução n° 347 ao determinar que os “encontros virtuais” podem ocorrer, desde que seja respeitado o momento adequado definido pelo corpo profissional. Também define que, caso o paciente esteja inconsciente, as videochamadas poderão ser realizadas somente se ele tiver manifestado que esta era sua vontade antes da perda da capacidade de consentir, ou com autorização de seus familiares.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.