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O que a Folha pensa

Paradoxo centenário

É de questionar se o Partido Comunista Chinês acomodará repressão e prosperidade

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Tela mostra o líder Xi Jinping nas celebrações dos cem anos do Partido Comunista Chinês - Thomas Peter/Reuters

O Partido Comunista Chinês chegou a seu primeiro centenário nesta quinta-feira (1º) vivendo um paradoxal zênite de seu poder.

A exemplo dos socialistas bolcheviques soviéticos que inspiraram sua fundação, a sigla deixou as franjas de um país empobrecido e fragmentado e tornou sinônimos Estado e partido.

Se a debacle da União Soviética ao longo dos anos 1980 assombra a elite política chinesa, é inescapável notar as diferenças entre os dois colossos autoritários.

Apesar de a China atual ter nascido da guerra em 1949 e de ter uma conta razoável de conflitos desde então, não foi a “manu militari” que definiu seu lugar no mundo.

A via de sua ascensão ao posto de segunda maior economia foi aberta pela potência dominante que desafia, os Estados Unidos. A aproximação entre os dois países, cada qual com seu interesse, permitiu a inserção global da formidável capacidade produtiva e do mercado consumidor chinês.

Foi criado um híbrido na forma de governo socialista promovendo capitalismo selvagem de Estado.
Ao mesmo tempo, após o desastre político do massacre da Praça da Paz Celestial, em 1989, o partido tentou se atualizar.

Está imiscuído na própria estrutura econômica, mas buscou liberar energias criativas e atender a demandas da classe média que a prosperidade relativa criou.

A ascensão de Xi Jinping em 2012 desaguou na maior concentração de poder desde os tempos de Mao Tsé-Tung e Deng Xiaoping.

O partido, indistinguível do Estado e, cada vez mais, de Xi, emprega meios sofisticados de controle social via tecnologia, testados à exaustão no controle da pandemia da Covid-19 surgida sob sua guarda.

E garras foram mostradas, como prova o assertivo discurso de celebração da data feito por Xi. O dissenso em Hong Kong foi dissolvido à força. Taiwan vê com temor seu futuro, assim como muçulmanos uigures avaliam seu presente.

Até aqui, o PC foi bem-sucedido em acomodar repressão e prosperidade. Mas a aposta de que a sociedade aceitará infinitamente o arranjo, clara na defesa da eternização do partido por Xi, é arriscada, por ignorar a natureza do mesmo impulso que gerou a fortuna.

É um processo contraditório, temperado pela exótica combinação de marxismo com confucionismo. A luta pela alma chinesa, a julgar a história multimilenar do país, parece estar só no começo.

editoriais@grupofolha.com.br

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