Qual reforma tributária vale a pena?

Para unir as demandas por justiça tributária e competitividade internacional não é imprescindível mudar o modelo atual de tributação da renda

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Vanessa Rahal Canado

No mês passado, o presidente da Câmara dos Deputados cobrou incisivamente do governo que enviasse a segunda fase da reforma tributária. Talvez para tornar mais palatável o debate.

Embora haja sutilezas determinantes para o bom resultado, a tributação da renda é mais intuitiva e atrai a atenção popular, diferente dos tributos sobre o consumo --invisíveis à população que paga.

Fiz mestrado e doutorado em direito tributário. Nunca ouvi que o ICMS, o ISS ou o IPI eram tributos sobre o consumo. De fato, não somos nós que recolhemos esses impostos —são as empresas. E o direito chega até aqui. A constatação de que são tributos sobre consumo depende do olhar da economia: os valores recolhidos pelas empresas são repassados nos preços até chegarem ao consumidor final.

Não é diferente com a renda. O imposto de renda cobrado da pessoa jurídica implica diminuição do lucro distribuído aos sócios. As pessoas jurídicas são criações do direito e a elas se atribui a obrigação legal de pagar os impostos.

Convicções pessoais e a cegueira provocada pelo divórcio entre direito e economia nos trouxeram até aqui.

A tributação dos dividendos começou a ser defendida utilizando-se os dados das Declarações de Imposto de Renda das Pessoas Físicas (Dirpf). Em 2016, proprietários de empresas que recebiam mais de 160 salários mínimos por ano tinham 71% dos seus rendimentos isentos de tributação. Eram os dividendos de 47 mil declarantes.

De outro lado, o setor privado passou a questionar essa isenção sob o argumento de que o Brasil estaria se tornando menos atrativo na competição internacional por investimentos. A alíquota do imposto de renda corporativo (IRPJ) seria alta por concentrar em uma única etapa a tributação dos lucros empresariais. Melhor seria baixar o IRPJ e tributar os dividendos, como nos demais países. A ideia ganhou força após a redução do Corporate Income Tax de 35% para 21% pelo governo de Donald Trump. Muitos países seguiram esse movimento.

O primeiro grupo não separou o joio do trigo. Os dividendos recebidos de empresas do lucro real já pagaram imposto de renda sobre todo o lucro apurado. O problema está nas empresas do Simples e do Lucro Presumido, que pagam imposto de renda apenas sobre uma parte do lucro apurado.

A reação do setor privado surpreendeu: "O que importa é a carga total de imposto de renda, não só o IRPJ, para atração de investimentos". É fato que a redução de 5 pontos percentuais do IRPJ com a imposição de 20% sobre os dividendos indica que não houve neutralidade na proposta. Entretanto há outros ajustes que tornariam nosso país mais atrativo. A reforma da tributação do consumo seria um deles.

Vanessa Rahal Canado, coordenadora dos cursos de pós-graduação em direito do Insper e consultora em política tributária, foi assessora especial do ministro da Economia entre 2019 e 2021
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