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Veto ao fundão

Exorbitantes, valores cogitados para verba eleitoral levam a retrocesso político

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Jair Bolsonaro e Ciro Nogueira, que assume a Casa Civil - Adriano Machado/Reuters

Não surpreende que Jair Bolsonaro, depois de anunciar a intenção de vetar a possibilidade de aumento do gasto público com as eleições gerais de 2022, tenha recuado a uma posição bem mais complacente.

Na semana passada, o presidente rechaçara o texto aprovado pelo Congresso que permite a elevação do fundo eleitoral para R$ 5,7 bilhões, apontando que seria mais adequado corrigir pela inflação os R$ 2 bilhões destinados ao pleito anterior. Na segunda-feira (26), falou vagamente em aprovar um montante próximo de R$ 4 bilhões.

Ainda não se sabe como uma nova cifra será formalizada na legislação —se é que haverá mesmo nova cifra. Certo é que Bolsonaro não se encontra em condições políticas de desafiar abertamente seus aliados do centrão, o bloco parlamentar que ganhou peso inédito no governo com a chegada de Ciro Nogueira (PP-PI) à Casa Civil.

Impõe-se, de todo modo, um recuo na ofensiva perdulária dos partidos, que afronta eleitores e contribuintes. São fartas as evidências de que os números cogitados constituem uma exorbitância.

Dados reunidos pelo Movimento Transparência Partidária apontam que as legendas teriam financiamento público equivalente a US$ 1,3 bilhão (contanto ainda com o fundo regular de sustentação das siglas), de longe o maior valor entre 25 países pesquisados —num distante segundo lugar está o México, com US$ 307 milhões.

O descalabro não se limita ao gasto injustificável em um Orçamento depauperado, enquanto educação, saúde, assistência e outras prioridades estão sujeitas a severas restrições. Trata-se, também, de um retrocesso para a política.

Partidos devem buscar inserção crescente na sociedade, atraindo filiados e simpatizantes com seu ideário, seus líderes e sua atuação. Convém, nesse sentido, que parcela substancial de seu custeio venha de contribuições privadas.

Existe, claro, o risco de o poder econômico exercer influência desproporcional sobre as legendas e, assim, sobre as decisões de governo. Tal problema pode ser mitigado com tetos nominais para doações, como defende esta Folha.

No Brasil, porém, optou-se de forma precipitada pela proibição de doações empresariais, na esteira dos escândalos de corrupção revelados pela Lava Jato. A escolha não elimina velhas mazelas, como o caixa dois. E cria novas.

Siglas que proliferam no país sem identidade e conteúdo —essa é uma descrição do centrão— vão preferir extrair cada vez mais recursos do Estado a buscar adesões na sociedade para seu sustento. Nesse processo, as burocracias partidárias têm maior incentivo a usar o dinheiro em benefício próprio e sem transparência.

A experiência aponta que é razoável manter alguma fonte pública para o financiamento eleitoral, sem tolher em demasia a via privada. Um debate maduro deve estabelecer limites para ambas.

editoriais@grupofolha.com.br

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