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Leonel Cesarino Pessôa

A reforma do imposto sobre a renda e o Simples Nacional

Sócios-proprietários têm tratamento diferenciado no relatório da Câmara

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Leonel Cesarino Pessôa

Doutor em direito pela USP e professor da FGV Direito SP

O modelo atual de tributação da renda tem méritos: aumentou a arrecadação, diminuiu o custo de conformidade e é efetivamente um caso raro de tributo que não gera um contencioso excessivo. Sua reforma ou aperfeiçoamento deveria ser o resultado de um debate maduro, que absolutamente não aconteceu.

Enquanto a reforma da tributação do consumo foi debatida por anos, no caso do imposto sobre a renda tudo está acontecendo a toque de caixa, sem que se discuta minimamente em que medida o projeto proposto é efetivamente o melhor caminho para que os supostos objetivos da reforma sejam alcançados.

Nesse sentido, com relação às empresas optantes pelo Simples Nacional, dois pontos chamam a atenção: sobre o negócio, a defesa da renúncia do Simples que se observa na imprensa e, sobre seus sócios-proprietários, o tratamento diferenciado que eles estão recebendo no relatório apresentado pelo deputado Celso Sabino (PSDB-PA).

Em relação ao negócio, argumenta-se que a razão entre os tributos federais e a receita bruta apurada pelas empresas do Simples, que seria de 8,2%, superaria a do lucro real (que seria de 7%) e que, por isso, não seria correto se falar em renúncia no Simples.

A razão entre tributo e receita bruta não é um indicador adequado, porque não considera a diferença entre as margens de lucro e pode conduzir a engano. Uma relação de 7% numa empresa com margem baixa pode significar um custo tributário maior que 8,2% numa empresa com margem alta.

As conquistas do sistema atual, isto é, a simplificação e a redução dos custos de conformidade alcançadas com a criação dos regimes do lucro presumido e do Simples Nacional, datam de meados da década de 1990. Mas, em 1996, a estimativa de renúncia com o Simples Nacional era de R$ 500 milhões e havia uma série de categorias que não podiam optar pelo regime. Em 2006, a estimativa de renúncia ainda era de pouco mais de R$ 8 bilhões.

A partir de determinado momento, no entanto, ano após ano, as restrições para o ingresso no regime foram se reduzindo, e o limite de faturamento exigido foi aumentado até que, em 2019, o gasto estimado com o Simples atingia quase R$ 90 bilhões.

A justificativa para essa ampliação seria uma suposta maior criação de emprego pelas micro e pequenas empresas (MPE). No entanto, a literatura internacional não indica que maior criação de emprego seja característica de toda MPE, mas das mais novas e de determinados setores. Por outro lado, os poucos estudos empíricos realizados sobre o programa no Brasil examinam dados do início da vigência do Simples federal e não apontam para essa direção.

Mas as distorções geradas pelo desenho atual do regime são acentuadas na proposta do relator. Isso porque, por mais que a relação custo-benefício pudesse justificar um tratamento diferenciado para as empresas optantes pelo regime, esse tratamento diferenciado não poderia se estender à remuneração dos sócios-proprietários dessas empresas.

Por meio de exemplos, Bernard Appy vem apontando, há anos, as iniquidades que resultam de nosso sistema quando comparada a tributação de um profissional liberal de alta renda (titular de empresa que tenha optado pelo Simples) e a de um empregado assalariado.

Nós temos acompanhado, nos últimos meses, a dificuldade que está sendo corrigir o limite de isenção da tabela do IR. Ainda que não esteja sendo recuperada nem mesmo a inflação do período, concluiu-se que não se poderia, em hipótese nenhuma, reajustar a tabela para além dos R$ 2.500 definidos já no projeto enviado pelo governo.

Por algum motivo, no entanto, a primeira versão do projeto, que já continha um limite de isenção na tributação dos dividendos de R$ 20 mil, foi alterada de forma a estender a isenção para todas as empresas optantes pelo Simples. E ninguém parece se incomodar com isso.

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