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Oscar Hipólito e Luiz Alvares Rezende de Souza

Guerra de preços no ensino superior

Inovação na capacitação de docentes pode pôr fim a ciclo perverso

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Oscar Hipólito

Professor titular da USP, é assessor educacional da Numbers Talk - Business Analytics e diretor acadêmico da Cintana Education (Brasil)

Luiz Alvares Rezende de Souza

Presidente da Numbers Talk - Business Analytics

O ensino superior brasileiro está atravessando uma crise que foi fortemente agravada pela pandemia de Covid-19. Os dados do censo da educação superior dos últimos cinco anos mostram uma desaceleração no crescimento do número de estudantes —que não tem sido pior graças ao avanço do ensino a distância.

Na tentativa de reverter essa situação e atrair mais estudantes, as instituições de modo geral, mesmo a contragosto, têm optado por entrar na guerra de preços em vez de retornar ao seu planejamento estratégico, analisar e trabalhar a fundo as causas subjacentes do problema e propagar com clareza seu propósito institucional, sua causa ou crenças para recompor e expandir seu quadro de alunos.

Para contribuir com essa reflexão, uma parte do capítulo 2 do livro de Simon Sinek, “Comece pelo Porquê” (GMT Editores, 2018), foi adaptado para o caso das Instituições de Ensino Superior (IES).
“Praticamente não existe no mercado um curso que um aluno não possa realizar em outra IES por mais ou menos o mesmo preço, mais ou menos a mesma qualidade, mais ou menos o mesmo nível de serviço oferecido e mais ou menos as mesmas características. Se a IES oferecer alguma coisa verdadeiramente nova, a concorrente virá com algo semelh ante e talvez até melhor.

Mas, se perguntar à maioria dos líderes das ​IES por que seus estudantes são seus estudantes, a maioria dirá que é por causa da qualidade, das características, do preço ou do serviço oferecido. Em outras palavras, a maior parte das IES não consegue explicar por que seus alunos são seus alunos.
Como saberão então atrair mais estudantes e incentivar a fidelidade entre os que já pertencem aos seus quadros? A verdade é que a maior parte delas está tomando decisões com base em um conjunto incompleto, ou pior, completamente falho de suposições sobre o que está impulsionando o setor educacional.

Existem apenas duas maneiras de influenciar o comportamento do estudante: manipulá-lo ou inspirá-lo. Manipular não no sentido pejorativo, mas como uma tática muito comum e até certo ponto benigna. As manipulações típicas incluem: redução de preço; promoção; exploração do medo, da pressão do grupo social ou de mensagens baseadas em desejos e aspirações do estudante; e promessas de inovação para influenciar o comportamento do aluno.

Muitas instituições relutam em entrar no jogo do preço, mas acabam fazendo isso porque sabem que é eficaz. Tão eficaz que a tentação às vezes pode ser arrasadora.

Entrar no jogo do preço, no entanto, pode representar um tremendo custo e criar um dilema significativo para a instituição. Uma vez que os estudantes se acostumam a pagar um preço mais baixo por um curso, será muito difícil para eles voltarem a pagar o valor normal. E o marketing, diante de uma pressão avassaladora para empurrar os preços cada vez mais para baixo para se manter competitivo, vê suas margens ficarem cada vez menores. Isso aumenta a necessidade de atrair mais estudantes para compensar. E a maneira mais rápida é, de novo, reduzindo os preços. Instala-se assim o vício da espiral descendente de preço.

Não se pode negar que as manipulações funcionam. E porque funcionam, tornaram-se a norma praticada pela grande maioria das IES, independente de tamanho e de forma organizacional. Elas podem de fato influenciar o comportamento do estudante e ajudar a IES a ter sucesso. Mas nenhuma delas cria fidelidade. Ao longo do tempo, os custos se tornam cada vez maiores. Os ganhos são apenas de curto prazo. E as manipulações ainda elevam o nível de estresse, tanto para os estudantes quanto para a IES.”

Essa guerra de preços empurra o setor para soluções de escala que não necessariamente favorecem a criação de inovações que enderecem as necessidades e problemas específicos dos alunos e as características regionais do mercado de trabalho. Impõe uma tendência à padronização e torna a educação uma “commodity” com perda de qualidade.

Como fugir desse ciclo perverso? Inovação. Inovar especialmente na capacitação dos docentes para utilizar tecnologias educacionais. Inovação em estabelecer parcerias estratégicas internacionais e nacionais para enfrentar conjuntamente os desafios da educação, que têm crescido e são a chave para um futuro diferente e melhor.

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