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Leonardo Massud

Para, (O)limpíadas!

Inclusão de fato seria evento único, intercalando provas entre todos os atletas

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Leonardo Massud

Advogado e professor da PUC-SP, é pai do Stefano, 14, autista, e do Vittorio, 11

Estes rabiscos não pretendem substituir ou sobrepor-se a ninguém. É apenas a reflexão de quem vê na manutenção das Paralimpíadas uma versão sofisticada de continuar a excluir a pessoa com deficiência.

É certo que as Paralimpíadas trazem muita visibilidade para o que continuamente insistimos em não enxergar. Pessoas maravilhosas, com resiliência, perseverança e força assombrosas, convidando-nos a ressignificar nossas próprias vicissitudes. Mostram-nos os quão pobres e vazios são os modelos estéticos que construímos como humanidade que, até hoje, não deixou de ser eugênica, higienista e preconceituosa.

Por que ficamos sempre boquiabertos com os feitos dos paratletas? Talvez porque apenas durante 15 dias, a cada quatro anos, “convivemos” com essas pessoas.

Vários esportes já separam pessoas em categorias. As lutas, em razão do peso. Quase todos os outros, em razão do gênero. Isso porque tais condições, em sua maioria, representam uma importante distância de velocidade, força e resistência, e seria demasiado injusto fazer com que essas pessoas competissem a mesma prova.

Mas serão menos nadadores, corredores, lutadores, jogadores aqueles que se encontram inseridos numa das categorias das Paralimpíadas em relação àqueles outros que recentemente nadaram, correram, lutaram ou jogaram os Jogos Olímpicos? As provas daqueles são tão provas quanto as destes últimos. E por que separamos esses atletas? Será que somos inclusivos se tudo o que fazemos é bater palmas para os paralímpicos e exaltar seus feitos duas ou três vezes por década? Será que é porque os queremos como atrações, mas não os queremos assim tão perto? Não faltarão as desculpas de sempre: “mas a estrutura”, “porque a logística”, “o calendário”, “os meios de comunicação”... Talvez, do ponto de vista mercantil, seja mais prático separar e “vender” dois produtos bem caracterizados.

De fato, como alguém disse outro dia, o esporte é uma espécie de alegoria da vida. Nas Paralimpíadas, isso parece ainda mais eloquente: segregamos sem nenhuma cerimônia; ou melhor, com duas grandes cerimônias! De abertura e encerramento.

Com todo o respeito às opiniões contrárias, eu gostaria de ver uma única edição de Jogos Olímpicos! Provas que intercalam os gêneros masculino e feminino, mas alternam também as pessoas com e sem deficiência. Quem sabe assim, numa sociedade tão capacitista, não só as medalhas de todas as modalidades e o seu quadro por país terão um outro sabor, mas, principalmente, passaríamos a valorizar, em si, a prova disputada e o caminho dos atletas. E, ao fazê-lo com os esportistas, passaríamos a fazer com nós mesmos. Talvez aí descobriremos finalmente que o importante não é chegar na frente, mas chegarmos juntos.

Se as Paralimpíadas representaram um importante caminho para o processo de inclusão, depois de mais de 60 anos da sua primeira edição está na hora de dar um passo adiante.

Por uma só Olímpíada, e por uma sociedade na qual todas as pessoas possam ser quem elas são e quem elas querem ser. E que estejam em todos os lugares.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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